Antes de mais nada, há de se ressaltar os méritos indiscutíveis
de “Lincoln” (2012). O diretor Steven Spielberg mostra a sua notória capacidade
narrativa ao conceber uma narrativa de quase três horas, repleta de cenas com
longos diálogos e soturnos ambientes fechados, em que o espectador não sente
muito o tempo passar. A direção de arte do filme também é um ponto alto,
trazendo uma interessante combinação entre a fidelidade na recriação histórica
e a estilização. Por outro lado, a produção se caracteriza como um dos momentos
menos inspirados na filmografia de Spielberg no sentido de criatividade. O
grande equívoco da obra está no descompasso do seu texto com a abordagem
concebida pelo diretor. O roteiro aparenta uma intenção desmistificadora ao
colocar que a emenda abolicionista conquistada pelo protagonista
veio à custa de clientelismo e corrupção. Dessa forma, o filme exigiria um
estilo de distanciamento emocional, sem arroubos sentimentais, até mesmo de perfil
irônico, ou seja, uma abordagem que Spielberg já tinha adotado
com brilhantismo no extraordinário “Munique” (2005). O resultado final,
entretanto, é diverso: em várias seqüências de “Lincoln”, ele adota
um estilo entre o didático e o laudatório, quase como se o filme fosse dedicado
a ser exibido em aulas de Moral e Cívica nos EUA. Por mais que a trama procure
evocar que não há uma delimitação tão precisa entre o bem (abolicionistas) e o
mal (escravagistas), o tratamento oferecido por Spielberg se resume a um conto
maniqueísta de mocinhos e bandidos. Pelo menos de cinco em cinco minutos, alguém
profere algum discurso edificante, o que reforça ainda mais o caráter “institucional”
da coisa toda. E nessa onda, até mesmo o elenco acaba embarcando em interpretações
preguiçosas ou destituídas de alguma dimensão humana expressiva – Daniel Day
Lewis e Tommy Lee Jones parecem no piloto automático, enquanto Sally Field se
limita a um histerismo enjoativo.
No final das contas, “Lincoln” acaba reforçando que
Spielberg é um diretor muito mais memorável e capaz de surpreender quando
embarcas nas produções ditas “pipocas” como “Tubarão” (1975), “Os caçadores da
arca perdida” (1981), “Parque dos dinossauros” (1993)e “As aventuras de Tintim”
(2011)
Não que eles estejam no piloto automático, mas que poderiam terem se saído melhores assim poderiam.
ResponderExcluir