Mais do que simplesmente contar um fato real, o documentário
“A vida privada dos hipopótamos” (2014) busca a discussão do próprio método do
gênero cinematográfico ao qual pertence. Não que a temática abordada não seja
interessante – a história do técnico em informática norte-americano Christopher
Kirk que vai para a Colômbia conhecer os hipopótamos africanos comprados por
Pablo Escobar, apaixona-se por uma exótica e bela nativa, depois se transforma
em traficante internacional e acaba preso e condenado em São Paulo traz uma dimensão
humana e simbólica fascinante em suas nuances dramáticas. A jornada pessoal do
Kirk traz o subtexto marcante do indivíduo originário de um país organizado e
racional do primeiro mundo que cai na gandaia sensual e caótica de uma capital terceiro-mundista
e termina tragado num vórtice de prazer e culpa. A boa sacada estética dos diretores
Maíra Bühler e Matias Mariani é enquadrar a saga intimista de seu protagonista dentro
de uma concepção formal caseira, dando a impressão de que o filme emula um diário
audiovisual de Kirk. Assim, ferramentas como textos de mails, filmagens de celulares
e depoimentos via skype se integram de forma natural com técnicas tradicionais documentais,
configurando uma narrativa densa e envolvente no seu misto de dramaticidade e
ironia. Por vezes essa desconstrução dos mecanismos típicos do gênero soa
excessiva, principalmente quando os próprios cineastas se inserem na narrativa
como personagens (esse tipo de recurso, para soar orgânico e não forçado, exige
um grau de mestria e sagacidade que só um diretor brilhante e experiente como
Eduardo Coutinho, por exemplo, tem a manha de colocar em prática). Ainda sim, “A
vida privada dos hipopótamos” é uma obra acima da média em relação à boa parte
do que tem aparecido nos documentários nacionais recentes.
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