Na animação “A crise carnívora” (2007), o diretor espanhol Pedro
Rivero investia numa equação narrativa insólita baseada em grafismo sujo, humor
negro, violência, escatologia e alegoria política. Voltando ao gênero animação
em “Psiconautas – As crianças esquecidas” (2015), Rivero, junto ao quadrinista
Alberto Vásquez, refina a estética e a temática de seu trabalho anterior e
entrega uma obra memorável. O roteiro combina de maneira natural e poética aventura
pós apocalíptica, uma visão sombria sobre a dependência química e simbolismos
diversos, sempre sob uma perspectiva humanista e complexa. No desenvolvimento e
resolução da trama, não há espaço para o simples maniqueísmo ou moralismo
fáceis, havendo uma exposição crua e amarga das hipocrisias e preconceitos
típicos da sociedade ocidental contemporânea. Rivero e Vásquez investem num
formalismo personalíssimo – ao invés da perfeição realista ou da estilização
padrão de boa parte das animações dos grandes estúdios, há a valorização de um
traço de bizarra beleza pictórica, repleta de nuances imagéticas plenas de
lirismo e sagacidade. Repare-se, por exemplo, na figura do protagonista
Birdboy, cuja caracterização visual remete a uma estranha síntese de pássaro e
criatura gótica. Aliás, a própria concepção dos personagens do filme reflete as
ideias desconcertantes de “Psiconautas”, em que aparentemente “fofinhos” seres
antropomorfizados são inseridos em situações e cenários desoladores e sórdidos.
No conjunto geral das escolhas artísticas da produção, fica a impressão de um
contundente trabalho a evidenciar um mundo se desagregando em meio a um cenário
de obscurantismo místico e exploração econômica, reflexo não muito distante de nossa
realidade.
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