A filmografia do diretor gaúcho Carlos Gerbase, pelo menos
em termos de longas-metragens, se divide entre esforçadas tentativas e filmes
francamente ruins. Assim, “Bio – Construindo uma vida” (2017) acaba sendo uma
surpresa positiva, pois é seu longa melhor sucedido em termos artísticos. A
encenação talvez tenha sido o grande ponto fraco de suas produções anteriores,
sendo que nessa obra mais recente ele finalmente consegue resolver esse
problema ao formatar o seu filme como um falso documentário com elementos de
ficção científica, melodrama e comentário sócio-político-histórico. Na maioria
das sequências, os personagens estão sentados dando depoimentos de fluência e
ritmo que beiram o literário. A concepção estética-temática aqui descrita pode
sugerir algo confuso ou simplesmente esdrúxulo, mas o mérito de Gerbase é dar
para tudo isso uma fluência narrativa envolvente, além do roteiro revelar um
subtexto de nuances humanistas comoventes. Nesse sentido, também é interessante
observar como a abordagem política-existencial de “Bio” ganha uma ressonância
especial na associação que se faz com o tenebroso momento histórico que
vivemos. Com sutileza irônica demolidora, a obra satiriza o obscurantismo religioso
e a educação baseada em alienação e valores morais reacionários perpetrados
pelo status quo conservador, valorizando, por outro lado, as ciências e as
artes como forma de libertação e transcendência. Por vezes o longa padece de
fotogenia e assepsia visual excessivas, mas esse é um detalhe negativo que se
compensa por algumas ousadias, como a atilada direção de atores, a caracterização
estilizada de um futuro high tech e o misto de serenidade melancólica e humor
sardônico de algumas passagens da trama. Aliás, a forma engenhosa como a ficção
científica é incorporada na narrativa parece em sintonia com o fato de que
Gerbase por muito tempo foi baterista e compositor dos Replicantes, cujo nome é
referência óbvia ao clássico sci fi “Blade Runner – O caçador de androides”
(1982) e as letras de algumas das canções citavam um futurismo nebuloso.
Boa parte de amigos e conhecidos costuma dizer que as minhas recomendações para filmes funcionam ao contrário: quando eu digo que o filme é bom é porque na realidade ele é uma bomba, e vice-versa. Aí a explicação para o nome do blog... A minha intenção nesse espaço é falar sobre qualquer tipo de filme: bons e ruins, novos ou antigos, blockbusters ou obscuridades. Cotações: 0 a 4 estrelas.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário