sábado, janeiro 31, 2009

O Curioso Caso de Benjamin Button, de David Fincher ***


Não que a obra em questão seja um filme ruim. A direção de arte é muito bem cuidada, a fotografia é de bom gosto, os efeitos especiais são realmente deslumbrantes. Ou seja, é um bom filme... O problema é que a gente sai do cinema com a sensação de que poderia ter sido muito melhor. David Fincher é um diretor que tem em seu currículo obras-primas como “Seven” (1995), “O Clube da Luta” (1999) e “Zodíaco” (2007), e a premissa inicial do filme, baseada em um conto de F. Stott Fitzgeral, é altamente promissora. O resultado é decepcionante, tendo em vista uma excessiva assepsia que paira por todo o filme. Em alguns momentos, o filme parece uma mistura indigesta de elementos de outros filmes que “deram certo”: o gosto por situações e personagens exóticos de “O Fabuloso Destino de Amelie Poulan”, a mistura de fábula com eventos reais de “Forrest Gump”, uma história de amor impossível de “As Pontes de Madison”. Falta personalidade e vida para “O Curioso Caso de Benjamin Button”, o que acaba sendo surpreendente para um cineasta tão criativo como Fincher, sendo que essa junção burocrática de influências acaba soando mais como uma tentativa de obter o máximo possível de indicações para o Oscar (o que acabou realmente acontecendo).

O Dia Em Que a Terra Parou, de Scott Derrickson ***


Antes de mais nada, vamos esclarecer um ponto que parece obvio, mas que é sempre bom lembrar: essa refilmagem não chega aos calcanhares do filme original de 1951. E tendo isso em mente e se livrando daquela coisa de cinéfilo radical de ficar comparando versões detalhe por detalhe, o que resta é uma ficção científica agradável e divertida. Os efeitos especiais são excelentes, a trama consegue ter alguns bons momentos de tensão, apesar de algumas escorregadas para o sentimentalóide, e o diretor Scott Derrickson consegue uma proeza considerável: até a inexpressividade do Keanu Reeves é bem aproveitada! Afinal, interpretar um alienígena humanóide não exige maiores vôos de interpretação...

terça-feira, janeiro 27, 2009

Onde Andará Dulce Veiga?, de Guilherme de Almeida Prado ***1/2


“Onde Andará Dulce Veiga?” (2007) é um tipo raro de filme dentro do atual panorama do cinema nacional. Em vez de fazer “crítica social” ou dar lições obtusas de história, o cineasta Guilherme de Almeida Prado busca o desenvolvimento de uma linguagem cinematográfica rebuscada e original, onde uma gama de referências vindas não só do cinema como também da música, literatura e quadrinho forma um estranho e atraente amálgama visual e sonoro. Prado não quer apenas que o espectador acompanhe a sua trama rocambolesca, mas que também embarque numa verdadeira viagem sensorial não só pelo imaginário do próprio diretor, mas também por um imaginário cultural coletivo. Muitos elementos que saltam das telas em “Onde Andará Dulce Veiga?” são familiares aos nossos olhos, mas também trazem uma sensação de algo insólito.

Mesmo sendo um pouco mais irregular e convencional do que a obra-prima “A Hora Mágica” (1998), “Onde Andará Dulce Veiga?” acaba sendo uma obra cinematográfica esteticamente vigorosa e ousada como poucas a aparecer ultimamente em nossas salas. Afinal, não é todo o dia que se vê misturado de forma tão coesa elementos aparentemente tão díspares como o surrealismo de David Lynch, influências de cinema noir, erotismo deslavado típico do cinema da Boca do Lixo e o espírito brasileiro escancaradamente romântico derramado de uma samba canção...

A Troca, de Clint Eastwood ***1/2


Quem for ao cinema para ver “A Troca” (2008) esperando algo do nível de “Os Imperdoáveis” (1992), “Sobre Meninos e Lobos” (2003) e “A Conquista da Honra” (2006) pode se decepcionar um pouco. O primeiro terço do filme, apesar de uma direção sóbria e classuda de Eastwood, parece excessivamente com aqueles dramas “baseado em fatos reais” que passavam direto no Supercine. Do tipo, “mulher determinada enfrenta os preconceitos de uma sociedade machista e sofre pra caramba”. Só que o velho Clint guardou um belo ás na sua manga, e lá pela metade de “A Troca” ele começa a desenvolver uma trama paralela que envolve um psicopata matador de crianças. Nessa segunda trama, o seu estilo filmar, seco e contundente, aliado a uma fotografia luminosa que contrasta de forma magnífica com o teor soturno da narrativa, dá uma nova dimensão para um roteiro convencional, fazendo com que se a trama se distancie do maniqueísmo simplório e desemboque numa arguta exploração sobre a crueldade humana.

É interessante também a forma com que Eastwood obtém interpretações dos atores que beiram o naturalismo, principalmente dos coadjuvantes. A aparente inexpressividade de alguns rostos que aparecem ao longo de “A Troca” é muito mais eloqüente, repleta de nuances e de um impacto dramático maior do que as interpretações “over” de Angelina Jolie e de John Malkowich.

O saldo final de “A Troca” é evidentemente positivo: mesmo distante de ter feito uma obra-prima, Clint Eastwood mostra um raro domínio da linguagem cinematográfica, provando que continua tranqüilo dentro do clube dos grandes do cinema norte-americano.

Bolt – Supercão, de Chris Williams e Byron Howard ***


O melhor momento da animação “Bolt – Supercão” é a sua seqüência de abertura, justamente o breve período em que temos o “filme dentro do filme”, em que a aventura eletrizante que estamos assistindo na verdade é uma encenação de seriado que o personagem título protagoniza. São cerca de 15 minutos de uma ação desenfreada e brilhantemente executada, algo do nível dos sensacionais “Os Incríveis” (2004) e “Kung Fu Panda” (2008). Depois desse fantástico começo, quando se esclarece a farsa de que o cãozinho era um ator que desconhece estar vivendo apenas uma ficção, o filme desacelera bastante e se transforma em uma comédia de erros simpática e eficiente. Por mais que essa mudança na narrativa decepcione, é inegável que “Bolt – Supercão” é uma das produções infantis de 2008 mais cativantes, sendo que mesmo os seus momentos mais dramáticos têm a consistência exata para não cair no piegas. E só a já mencionada seqüência de abertura já faz valer o ingresso.

domingo, janeiro 18, 2009

Sete Vidas, de Gabriele Muccino ***


Apesar de “Sete Vidas” (2008) ser um bom filme, confesso que saí um pouco decepcionado do cinema. Digo isso porque tinha forte ainda na minha mente o impacto que tinha sido para mim o ótimo “A Procura da Felicidade” (2006), parceria anterior entre o diretor italiano Gabriele Muccino e o ator Will Smith. E é claro que não daria para esquecer outro excelente trabalho de Muccino, “O Último Beijo” (2001), uma das melhores produções italianas de década.

A narrativa de “Sete Vidas” traz um recurso que vem sendo muito utilizado nos últimos anos: ao longo da trama, tem-se uma situação nebulosa que vai sendo aos poucos esclarecidas com a utilização de pequenos flashbacks até que no final da trama o espectador recebe a resposta final para toda aquela confusão que vinha acompanhando. O que incomoda no filme é justamente que o tal esclarecimento do mistério é algo até previsível lá pela metade do mesmo, sendo que a forma como as pontas do roteiro se fecham no final é bem-comportada demais, tirando muito da força da tensão inquietante que permeia boa parte da obra.

Apesar desse problema na narrativa, “Sete Vidas” tem os seus méritos. Mesmo que a sua conclusão incomode pelo convencionalismo, não há como negar que há uma coerência brutal e sem concessões nas atitudes do protagonista vivido por Will Smith. A seqüência do seu suicídio chega a ser perturbadora, não só pela contundência, mas também pelo tom poético e quase onírico de tal momento do filme.

Um Homem Bom, de Vincente Amorim ***


Viggo Mortensen é aquele tipo de ator que faz com que eu sempre olhe com interesse qualquer filme que ele participe. Além de grande intérprete, o cara teve papéis marcantes em filmes memoráveis como “Reflexos do Mal” (1991), “Unidos Pelo Sangue” (2001), “O Pagamento Final” (1993) e “Marcas da Violência” (2005). Ou seja, tem o tino para escolher as produções das quais participa.

Em “Um Homem Bom” (2008), o desempenho notável de Mortensen como um professor e escritor pacífico que adere meio sem querer ao Nazismo é a força motriz do filme, com o autor desenvolvendo com mestria um papel complexo e cheio de nuances dramáticas. Mas seria injusto dizer que essa obra mais recente do brasileiro Vincente Amorim tem como único trunfo a atuação do seu protagonista. Mesmo caindo em alguns momentos em alguns excessos formalistas convencionais, o cineasta revela virtudes surpreendentes, principalmente nas seqüências em que a narrativa cai para um tom onírico e delirante que lembra bastante o cinema de David Lynch.

Uma Comédia Nada Romântica, de Jason Friedberg e Aaron Seltzer *1/2


Talvez a grande virtude de uma comédia esteja na capacidade de arrancar o riso do espectador a partir de um detalhe inesperado, além do fato de que essa surpresa deve brotar de forma quase que espontânea. É justamente essa combinação dos fatores do inesperado e da naturalidade que torna a comédia um dos gêneros mais transgressivos no cinema. Olhando por esse lado, dá para entender um pouco porque um filme como “Uma Comédia Nada Romântica” (2006) é uma obra que já nasce desgastada. Por mais que tenha a pretensão de satirizar outros filmes (no caso, as tais comédias românticas que saem aos borbotões de Hollywood), o seu humor é demasiadamente mecânico e sem vida, pois a obrigação de estar vinculada a fazer uma série de citações a outras obras cinematográficas faz com que a produção esteja atada a uma camisa-de-força que impede maiores vôos de inspiração e criatividade. Ocasionalmente, o filme até consegue ser engraçado, mas o que predomina na sua hora e meia de duração é um marasmo burocrático, o que é uma sentença de morte para qualquer comédia.

Nessa linha de satirizar gêneros cinematográficos, vale muito mais a pena assistir obras como “Todo Mundo Quase Morto” (2004), “Chumbo Grosso” (2007) e “A Vida é Dura” (2007), comédias que demolem com inteligência e ironia os clichês, respectivamente, dos filmes de horror, policiais e cinebiografias musicais, mas que ao mesmo tempo revelam até um conhecimento de causa e reverência a tais gêneros.

O Gato de Nove Caudas, de Dario Argento ****


Depurando ainda mais a peculiar linguagem cinematográfica de “O Pássaro de Plumas de Cristal” (1969), o cineasta italiano Dario Argento faz de “O Gato de Nove Caudas” (1971) um dos exemplares mais clássicos do gênero Giallo. Com uma rocambolesca e confusa trama envolvendo um psicopata assassino, o que o Argento faz é uma requintada e exagerada demonstração do seu virtuosismo plástico. Esqueça a lógica e a verossimilhança: o que temos aqui é um belíssimo exercício de fotografia e cenografia fortemente estilizadas, aliado a uma montagem influenciada pelo melhor da obra de Alfred Hitchcock. E falando no velho mestre inglês do suspense, o que me vem mente assistindo a “O Gato de Nove Caudas” é o pensamento de Argento como muito mais que um mero reciclador dos preceitos hitchcockianos. O cara é uma espécie de Hitchcock ainda mais barroco e hardcore, livre das amarras moralistas dos estúdios de Hollywood.

domingo, janeiro 11, 2009

Os 30 melhores filmes de 2008


1) Onde os Fracos Não Têm Vez, de Ethan e Joel Coen
2) Sangue Negro, de Paul Thomas Anderson
3) O Gângster, de Ridley Scott
4) Antes Que o Diabo Saiba Que Você Está Morto, de Sidney Lunet
5) Sweeney Tood – O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet, de Tim Burton
6) O Sonho de Cassandra, de Woody Allen
7) O Segredo do Grão, de Abedel Kechini
8) Queime Depois de Ler, de Ethan e Joel Coen
9) A Espiã, de Paul Verhoeven
10) O Nevoeiro, de Frank Darabont
11) Kung Fu Panda, de John Stevenson e Mark Osborne
12) Não Estou Lá, de Toddy Haynes
13) Control, de Anton Corbijn
14) Efeito Dominó, de Roger Donaldson
15) Os Senhores do Crime, de David Cronenberg
16) Reflexos da Inocência, de Bailie Walsh
17) Em Paris, de Christophe Honoré
18) Batman – O Cavaleiro das Trevas, de Christopher Nolan
19) Quase Irmãos, de Adam McKay
20) Trovão Tropical, de Ben Stiller
21) Paranoid Park – de Gus Van Sant
22) Cinturão Vermelho, de David Mamet
23) A Questão Humana, de Nicolas Klotz
24) (Rec), de Jaume Balagueró e Paco Plaza
25) Shortbus, de John Cameron Mitchell
26) Wall-E, de Andrew Stanton
27) Luz Silenciosa, de Carlos Reygadas
28) Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal, de Steven Spielberg
29) Rock’N’Rolla – A Grande Roubada, de Guy Ritchie
30) Rambo 4, de Sylvester Stalonne

Filmes dos últimos meses (cotações de 0 a 4 estrelas)

A Caçada, de Richard Shepard ***
Missão Babilônia, de Mathieu Kassovitz **1/2
O Banheiro do Papa, de César Charlone e Enrique Fernández ***
Um Franco, 14 Pesetas, de Carlos Iglesias **
Era Uma Vez..., de Breno Silveira **
Armênia, de Robert Guédiguian **1/2
Eu Sou Juani, de Bigas Luna ***
Os Bons Companheiros, de Martin Scorsese ****
Tua Vida em 65’, de Maria Ripoll *
Controle Absoluto, de D.J. Caruso ***
Montevideo Unde, de Martín Recto *
O Último Tango em Paris, de Bernardo Bertolucci ****
São Paulo Sociedade Anônima, de Luis Sérgio Person ****
O Mistério do Samba, de Lula Buarque de Hollanda ***1/2
Uma Garota Divida em Dois, de Claude Chabrol ***1/2
Ensaio Sobre a Cegueira, de Fernando Meirelles ***
O Longo Amanhecer – Uma Cinebiografia de Celso Furtado, de José Mariani **1/2
Busca Implacável, de Pierre Morel ***1/2
U2 – 3D, de Mark Pellington e Catherine Owens **1/2
Hellboy 2 – O Exército Dourado, de Guillermo Del Toro ***
A Questão Humana, de Nicolas Klotz ****
O Diário dos Mortos, de George Romero ***1/2
Trovão Tropical, de Ben Stiller ****
Juventude Transviada, de Nicolas Ray ****
Corrida Mortal, de Paul W.S. Anderson **1/2
XXY, de Lucia Puenzo ***
As Duas Faces da Lei, de Jon Avnet *
Persona, Ingmar Bergman ****
Domésticas, de Fernando Meirelles **1/2
Sympathy For The Devil, de Jean-Luc Godard ***1/2
O Pequeno Tenente, de Xavier Beauvois ***1/2
Reflexos da Inocência, de Baillie Walsh ****
Espelhos do Medo, de Alexandre Aja ***
Jogos Mortais V, de David Hackl **1/2
Obras – A Gente Sabe Quando Começa, de Brigitte Rouan *1/2
Conterrâneos Velhos de Guerra, de Vladimir Carvalho ****
Rock’nRolla – A Grande Roubada, de Guy Ritchie ****
Eles Não Usam Black Tie, de Leon Hirszman ****
Um Segredo Entre Nós, de Dennis Lee **
Os Desafinados, de Walter Lima Jr. ***1/2
O Homem Que Virou Suco, de João Batista de Andrade ****
Em Busca da Vida, de Jia Zhang-ke ***1/2
Quantum of Solace, de Marc Forster ***1/2
Vicky Cristina Barcelona, de Woody Allen ***1/2
A Paixão de Joana D’Arc, de Carl Dreyer ****
O Coca, A Roda, O Pneu e O Farol, de Mariana Fortes ***
Frankstein, de James Whale ****
Pan-Cinema Permanente, de Carlos Nader ***1/2
Os Estranhos, de Bryan Bertino ***1/2
A Duquesa, de Saul Dibb **1/2
Feliz Natal, de Selton Mello ***1/2
Max Payne, de John Moore *
Minha Vida Não Cabe Num Opala, de Reinaldo Pinheiro*1/2
Obsessão, de Luchino Visconti ****
Lemon Tree, de Eran Riklis **1/2
Queime Depois de Ler, de Joel e Ethan Coen ****
O Destino Bate a Sua Porta, de Tay Garnett ****
O Narciso Negro, de Michael Powell e Emeric Pressburger ****
Brinquedo Proibido, de René Clément ****
Rede de Mentiras, de Ridley Scott ***
Eu, Meu Irmão e Nossa Namorada, de Peter Hedges **1/2
O Segredo do Grão, de Abdelladif Kechiche ****
Quase Irmãos, de Adam McKay ****
Sindicato dos Ladrões, de Elia Kazan ****
Caos Calmo, de Antonello Grimaldi ***
Luz Silenciosa, de Carlos Reygadas ****
Panair do Brasil, de Marco Altberg **
Dois em Um, de Nicolas & Bruno **
O Traidor, de Jeffrey Nachmanoff ***
Paixões Que Alucinam, de Samuel Fuller ****
Beijo Na Boca Não, de Alain Resnais **1/2
Viagem à Itália, de Roberto Rossellini ****
Deus e o Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha ****
Procedimento Operacional Padrão, de Errol Morris ***1/2
A Bela Junie, de Christophe Honoré ***1/2
15 Anos e Meio, de François Desagnat e Thomas Sorriaux ½ (meia estrela)
Atrizes, de Valeria Bruni-Tedeschi ***1/2
Elogio ao Amor, de Jean-Luc Godard ***1/2
Madagascar 2, de Eric Darnell e Tom McGrath ***
Gomorra, de Matteo Garrone ***
Sem Destino, de Dennis Hopper ****
A Culpa é do Fidel, de Julie Gavras **1/2
O Sol, de Alexander Sokurov ***1/2
Romance, de Guel Arraes *1/2
Carga Explosiva 3, de Olivier Megaton *1/2
Baby Love, de Vincent Garenq **
Conto de Natal, de Arnaud Desplechin ***1/2
O Menino de Pijama Listrado, de Mark Herman ***
Um Bom Homem, de Vicente Amorim ***
36, de Olivier Marchal ****
A Vida é Dura, de Jake Kasdan ***1/2
Morrer ou Viver, de Takashi Miike ***1/2
Entre o Céu e o Inferno, de Craig Brewer ****
Portishead – Roseland NYC, de Dick Carruthers ***1/2
Star Wars – Guerras Clônicas, de Genny Tartakovsky ****
O Círculo Vermelho, de Jean-Pierre Melville ****
Charada, de Blake Edwards ***1/2
Banho de Sangue, de Mario Bava ****
Meus Caros Amigos, de Mario Monicelli ***1/2
Valente, de Neil Jordan ***1/2
Caçador de Assassinos, de Michael Mann ****
Idiocracy, de Mike Judge ***1/2
Eleição – o Submundo do Poder, de Johnny To ****
O Belo Antônio, de Mauro Bolognini ***1/2
Aquarius, de Michele Soavi ***1/2
Gângsters, de Olivier Marchal ****
The Toxic Avenger, de Michael Hertz ***
Desafiando o Assassino, de Richard Fleischer ****
Náusea Total, de Peter Jackson ***1/2
Neil Young: Heart of Gold, de Jonathan Demme ****

O Menino de Pimama Listrado, de Mark Hermann ***


O cinéfilo velho de guerra pode ler a sinopse e assistir ao trailer de “O Menino de Pijama Listrado” e pensar logo: “putz, já vi esse filme algumas vezes...” E o nosso amigo não deixar de estar com a razão. É mais uma obra que tem como pano de fundo histórico a II Guerra Mundial e um dos principais aspectos de tal conflito: a perseguição aos judeus pela Alemanha nazista. Além disso, o diretor Mark Herman acrescenta uma das maiores lugares comuns nesse tipo de produção que é enquadrar a trama sob uma ótica infantil. E nem precisar ser um cinéfilo tão calejado para pensar logo em “A Vida é Bela”. E em boa parte de sua duração “O Menino de Pijama Listrado” parece mesmo uma versão requentada do filme mais conhecido de Roberto Benigni. Tem-se uma direção de arte e fotografia competentes, mas que incomodam em determinados momentos por dar uma concepção asséptica demais, onde até a sujeira e a doença apresentam um revestimento “clean”.

Ocorre, entretanto, que no terço final no filme, Herman adota um tom sombrio e uma tensão fortíssima que conduzem “O Menino de Pijama Listrado” para uma conclusão sinistra e sem concessões para sentimentalismos, com um impacto mais forte até do que o desfecho de “A Vida é Bela”. O diretor não se preocupa em oferecer um alívio cômico ou redentor para a platéia, apresentando apenas o puro horror de uma guerra genocida.

A comparação metafórica pode soar ridícula, mas “O Menino de Pijama Listrado” parece o disco de uma banda de rock em que as primeiras faixas são insossas composições na linha emo, mas que lá pela metade descamba para um hardcore porrada que salva a pátria.

Os Guarda-Chuvas do Amor, de Jacques Demy ****


Filmes de referência ou ruptura dentro da história do cinema mundial são algo do qual seguidamente ouvimos falar, tanto por parte da crítica ou de público. O fato, entretanto, é que se fossemos analisar com cuidado quais seriam as obras que se encaixam em tal definição veríamos que na verdade são poucas. Acredito que "Os Guarda-Chuvas do Amor" de Jacques Demy é um dos raros filmes que podem ser colocados nesse seleto grupo, tendo em vista que é uma das mais radicais experiências de utilização da linguagem cinematográfica.

O que Demy fez basicamente foi perverter os cânones dos musicais e levá-los às ultimas conseqüências. Não bastaria simplesmente reservar seqüências em que os atores do nada saem cantando e dançando. Em "Os Guarda-Chuvas do Amor" todos os diálogos são cantados, como se o mundo fosse uma perpétua ópera. O efeito de tal opção estilística de Demy é fascinante. A progressão e a intensidade da belíssima música composta por Michel Legrand estão em perfeita sintonia com a própria evolução da trama. Essa estética de irrealidade do cineasta fica ainda mais acentuada pela opção de utilização de figurinos e direção de arte em tons monocromáticos, com claras influências de pintura e quadrinhos.

O roteiro de "Os Guarda-Chuvas do Amor" é outro de seus aspectos diferenciais. Enquanto em musicais, digamos, "normais" as tramas geralmente são mais simples ou meramente alegóricas, servindo apenas como pretexto para a dança e a cantoria, no filme de Demy há uma história que impressiona pelo tom realista e lúcido ao retratar as relações humanas, mostrando como o caso de amor entre Genevieve (Catherine Deneuve) e Guy (Nino Castenuolvo) acaba tendo um fim melancólico após o rapaz ser obrigado a prestar o serviço militar na Argélia. É fantástica a forma com que a crueza e amargura de tal trama entra em contraste com a concepção formal tremendamente estetizada de Demy.

A estranha junção de melodrama e musical proposta por Demy vai ao encontro com as idéias cinematográficas de outro diretor francês extremamente ativo na época (anos 60), o inquietante Jean-Luc Godard, que em filmes como "Viver a Vida" e "Uma Mulher é Uma Mulher" abusava de efeitos visuais e sonoros para aumentar ainda mais o impacto de suas cenas, buscando um cinema cada vez mais independente como linguagem própria. É justamente essa busca incessante de uma concepção original de cinema que faz de "Os Guarda-Chuvas do Amor" uma obra única no cinema, e que talvez tenha só tenha encontrado similares em alguns filmes de Ken Russel, principalmente na sensacional ópera-rock "Tommy".