sexta-feira, junho 30, 2017

Rodin, de Jacques Doillon **1/2

As intenções artísticas de Jacques Doillon para a cinebiografia “Rodin” (2017) até são bem louváveis – ao invés de fazer um grande “resumão” sobre a vida do escultor Auguste Rodin (Vincent Lindon), o roteiro se concentra em um recorte específico de um dos períodos mais relevantes da trajetória do artista, aquele em que ele atingiu a consagração ao passar a receber encomendas do Estado e também tomou como amante a escultora Camille Claudel (Izïa Higelin), fazendo com que haja uma reflexão sobre o eterno dilema da relação entre a vida privada e a arte, no sentido da forma com que ambas se influenciam, buscando-se ressaltar ainda o caráter libertário e contestador da atividade artística. Ao mesmo tempo que Rodin foge de vários padrões de previsibilidade na concepção e execução de alguns dos seus principais trabalhos, seu hedonismo furioso entra em conflito com os ditames moralizantes da França do século XIX. A ambição existencial e narrativa de Doillon, entretanto, não consegue se efetivar de maneira satisfatória. Encenação, fotografia e direção de arte formam um conjunto correto, mas que também implicam num certo engessamento narrativo e numa atmosfera de assepsia visual. Falta uma visão mais sanguínea e suja por parte do cineasta, em que mesmo quando o filme parte para sequências mais eróticas há a impressão de comedimento estético no sentido de não provocar grandes choques gráficos, o que faz demonstrar que o filme não estar em sintonia com a própria natureza da arte do biografado. Há méritos didáticos em “Rodin”, no sentido de sua contextualização histórica, mas falta humanismo e ousadia na sua síntese temática-formal.

quinta-feira, junho 29, 2017

Além das palavras, de Terence Davies ***

É claro que se pode acusar a direção do britânico Terence Davies em “Além das palavras” (2016) de um academicismo excessivo e de uma incômoda previsibilidade narrativa. Por outro lado, sua rigorosa concepção artística também é marcada por uma abordagem emocional sóbria e por uma encenação meticulosa que valorizam as nuances psicológicas e os complexos jogos sociais que marcam o contexto intimista e cultural em que se desenvolve a exposição de alguns fatos reveladores da biografia da poetisa norte-americana Emily Dickinson. É de se destacar também o roteiro que consegue captar com sensibilidade e fino senso de humor toda uma gama temática bastante variada e repleta de sutilezas existenciais, indo da caracterização brutal do patriarcalismo opressor da sociedade ocidental do século XIX até a valorização do poder da palavra literária – nesse aspecto, são notáveis alguns diálogos lapidares pelas suas dinâmicas espirituosas e subtexto de forte caráter contestatório, além da engenhosa forma como alguns trechos expressivos da poesia de Dickinson se inserem na narrativa. Davies também reforça a sua capacidade de extrair atuações memoráveis de seu elenco, com destaque para Cyhthia Nixon no papel principal e Keith Carradine em uma performance sorumbática e repleta de fleuma.

terça-feira, junho 27, 2017

Argentina, de Carlos Saura ***

É claro que, em se tratando do diretor espanhol Carlos Saura, “Argentina” (2015) está bem longe de entusiasmar tanto quanto as obras clássicas do cineasta nos anos 60 e 70 ou mesmo com outras de suas produções onde a música e a dança foram os enfoques temáticos principais. Incomoda um certo tom de assepsia na abordagem artística do documentário em questão, fazendo evocar por vezes um equivocado tom institucional. Ainda assim, é impossível para o espectador ficar impassível com a exuberâncias do ritmos, melodias e coreografias mostrados no filme e também com o refinamento narrativo e estético impresso por Saura em algumas sequências. No âmago de temas e danças de forte caráter telúrico se encontra uma arte marcada por humanismo pungente e considerável teor sócio-cultural contestatório, com Saura mostrando sensibilidade suficiente para captar com considerável fidelidade tais nuances. Dentro dessa concepção artística-existencial, os grandes pontos altos de “Argentina” se concentram nas belas homenagens para Mercedes Sosa e Atahualpa Yupanqui. 

segunda-feira, junho 26, 2017

Mulher-Maravilha, de Patty Jenkis ***

Para aqueles que se apavoraram com a ruindade de “Superman – O homem de aço” (2013), “Batman vs Superman – A origem da justiça” (2016) e “Esquadrão Suicida” (2016), assistir a “Mulher-Maravilha” (2017) provavelmente poderá render uma agradável surpresa. O filme dirigido por Patty Jenkins se enquadra dentro de um formato de aventura nostálgica classicista e por vezes até resvalando numa certa profundidade dramática convincente, bem distante da pretensão temática pseudo-sombria e do nefasto formalismo “video-game” das produções de super-heróis da DC dirigidas por Zack Snyder e pupilos. O pique de narrativa new age/mística enfadonha dos primeiros quinze minutos da obra correm o risco de aborrecer a plateia, mas quando Steve Trevor (Chris Pine) entra em cena as coisas realmente engrenam, com o filme se tornando um misto de drama de guerra e aventura de super-heróis que prima por algumas memoráveis cenas de ação, pela direção de arte estilizada e pelo carisma cativante do elenco (com exceção da inexpressiva Gal Gadot no papel título). Parte considerável das escolhas artísticas de Jenkins, principalmente em termos de roteiro e atmosfera, fazem lembrar o ótimo “Capitão América – O primeiro vingador” (2011), mas é bem melhor copiar o que deu certo num filme da Marvel do que seguir os mandamentos “originais” do picareta Znyder.

sexta-feira, junho 23, 2017

Tragedy girls, de Tyler Macintyre ***

O fato da produção norte-americana “Tragedy girls” (2017) ter tido exibição única e exclusiva no Brasil no FANTASPOA ajuda a ilustrar a importância do festival. Dá para imaginar uma produção como essa do diretor Tyler Macintyre, que abusa da violência gráfica e de um perverso senso de humor, sendo exibida no bem-comportado circuito comercial de salas de cinema de shoppings em Porto Alegre? Assim, fica evidente que somente num festival como o FANTASPOA que uma obra como essa no gênero horror B poderia ser ter a chance de ser apreciada numa tela grande. Não se trata propriamente de um filme com grandes ousadias estéticas ou temáticas, mas que tem um certo caráter instigante na forma com que expõe as hipocrisias do american way of life dentro de um formato que sintetiza com eficiência comicidade ácida e suspense com alto teor de violência gráfica, passando a léguas de distância do horror asséptico das franquias do gênero que costumam aportar por aqui. Além disso, Macintyre até se permite a incorporar algumas referências visuais e narrativas bastante pertinentes e intrigantes, de “Um corpo que cai” (1958) até “Carrie, a estranha” (1976). As acertadas escolhas artísticas do diretor levam “Tragedy girls” a uma conclusão brutal e perturbadora capaz de colar por um bom tempo no imaginário dos apreciadores do gênero.

quinta-feira, junho 22, 2017

Eu me casei com uma pessoa estranha!, de Bill Plympton ****

Na última edição do FANTASPOA, na sessão em que foi homenageado pelo festival, o diretor de animações norte-americano Bill Plympton foi questionado sobre qual teria sido a inspiração principal para a realização do longa-metragem “Eu me casei com uma pessoa estranha?” (1997). Respondeu que o seu mote principal na elaboração da produção foi a de que um animador é uma espécie de deus na concepção de sua obra, em que personagens e toda a ambientação que os circunda são regidos pela sua vontade. E é justamente essa a impressão que se tem ao assistir ao filme em questão – é como se Plympton jogasse na cara do espectador sem nenhuma cerimônia boa parte de suas obsessões, desejos e diatribes. A trama do filme obedece a uma lógica onírica e que beira o instintivo, em que vários pilares tradicionais da sociedade ocidental (família, religião, governo, militarismo) são pisoteados de maneira inclemente em nome de um ideário libertário. Nessa perspectiva, o sexo e a imaginação criativa são celebrados como os pontos máximos da expressividade humana, e como as únicas vias para uma possível transcendência existencial. Embalando essa expressiva visão sócio-política-filosófica, há um grafismo e uma narrativa de viés alucinado e beleza perturbadora – ao invés da estética realista ou de estilização bem-comportada das animações tradicionais dos grandes estúdios, prevalecem visual e atmosfera delirantes e algo “sujos”, jogando a plateia dentro de um imaginário síntese entre a contestação e o lisérgico.

quarta-feira, junho 21, 2017

Comeback, de Erico Rassi **

A premissa principal da trama de “Comeback” é promissora: numa cidadezinha furreca do interior do Brasil, um pistoleiro aposentado (Nelson Xavier) resolve voltar à ativa para resgatar a autoestima. Faz pensar numa espécie de faroeste atualizado e mesmo reconfigurado para o contexto brasileiro, algo como uma versão cabocla do clássico “O último pistoleiro” (1976). Na prática, entretanto, o que ocorre na tela fica bem distante das aparentes boas possibilidades. De certa forma, dá até para entender o direcionamento artístico proposto pelo diretor Erico Rassi, em que a indolência e mesmice do cotidiano desolador do protagonista Amador recebe a recíproca de uma narrativa de desenvolvimento e ambientação semelhantes. No final das contas, tal direcionamento formal-temático vai se mostrando cada vez mais frustrante e aborrecido na sua letargia criativa, fazendo com que a obra caia por vários momentos no sonolento e desinteressante. Mesmo quando os momentos de violência irrompem na tela, o que era para ser o ápice dramático fica apenas numa encenação tediosa e rotineira. No cômputo geral, as decisões estéticas e textuais de Rassi para o filme dão a impressão de quererem disfarçar uma preguiça do cineasta em oferecer algum momento mais ousado ou de maior impacto sensorial.

segunda-feira, junho 19, 2017

Faces de uma mulher, de Arnaud des Pallières ***

A estrutura narrativa de “Faces de uma mulher” (2016) obedece a formato e execução convencionais, focando na conturbada vida de uma mulher, sempre à beira da marginalidade sócio-econômica, com uma trama que se estrutura a partir de forma episódica e cronologicamente reversa a mostrar fatos importantes da maturidade, juventude e infância da protagonista. O roteiro obedece a uma lógica existencial um tanto moralista, além de ser previsível em alguns de seus desdobramentos. A efetiva força do filme de Arnaud des Pallières, e o que o torna uma experiência memorável, está no vigor de sua encenação e na intensidade dramática das atuações do seu elenco, com destaque em especial para Adèle Exarchopoulos, que entrega uma interpretação de admirável desenvoltura cênica, lembrando bastante o seu desempenho antológico na obra-prima “Azul é a cor mais quente” (2013).

sexta-feira, junho 16, 2017

México bárbaro II, de vários diretores ***

A temática do satanismo não é novidade dentro do cinema, principalmente quando se trata do gênero horror. Na grande maioria das produções que versam sobre o assunto, o diabo e seus seguidores são vistos como antagonistas a serem batidos, com seus princípios sendo vistos como uma distorção daquilo que é considerado aceitável pela ordem vigente. No filme episódico “México bárbaro II” (2017), a presença de demônios e afins tem uma relação com a própria cultura religiosa do seu país de origem, onde o catolicismo até hoje tem uma presença forte nos lares nacionais. Por outro lado, boa parte dos episódios que compõem a produção sugere uma visão mais libertária sobre o assunto, em que a fórmula narrativa sintetizando ironia perversa e terror explícito-escatológico gera algumas sequências memoráveis que variam entre o divertido e o perturbador. Por trás desses pequenos contos audiovisuais, há um forte discurso existencial a questionar uma sociedade patriarcal e cristã marcada pela opressão sócio-cultural, mas que também sabe preservar uma narrativa tensa e envolvente. De se destacar ainda o ótimo trabalho de trucagens, mais um fator que acentua a impressão de uma experiência cinematográfica extrema no seu sensorialismo demente.

quarta-feira, junho 14, 2017

Pouco antes do amanhecer, de Jeff Lieberman ****

O roteiro e a estrutura narrativa de “Pouco antes do amanhecer” (1981) podem fazer pressupor que a obra em questão seja mais um tradicional slasher daqueles que apareciam com frequência nos cinemas nos anos 80. Um olhar mais atento, entretanto, faz com que se perceba que o filme do diretor norte-americano Jeff Lieberman vai bem mais além. Encenação, direção de fotografia e edição evidenciam uma abordagem mais minuciosa e quase contemplativa na forma que delineia situações e personagens e esmiúça a ação. Ainda que haja os habituais assassinatos sangrentos de jovens incautos em um local interiorano isolado, não se chega a privilegiar tanto a violência explícita, com Lieberman se mostrando mais concentrado na elaboração de uma narrativa atmosférica pautada pela tensão e ironia. É como se o cineasta fizesse uma releitura mais sardônica do clássico “Amargo pesadelo” (1972) e carregada num simbolismo ainda mais contestador, principalmente na visão ácida sobre a caipirice obscurantista do interior dos Estados Unidos e na reverência ao empoderamento feminino na figura da protagonista que se recusa a permanecer no papel de vítima inocente e indefesa.

segunda-feira, junho 12, 2017

Corra!, de Jordan Peele ***1/2

Combinar drama racial com preceitos de horror gótico típicos de cinema B pode parecer uma mistura indigesta em um primeiro momento. Nas mãos do diretor Jordan Peele, entretanto, tudo isso adquire uma estranha coerência. “Corra!” (2017) é uma obra que prima pelo exagero – com direito, inclusive, a passagens no roteiro envolvendo transplantes cerebrais! – mas é justamente nesse aspecto do excesso que o filme se torna tão marcante. A caracterização de personagens, situações e ambientação é ambígua – na superfície, há uma beleza que é asséptica, evocando sempre uma espécie de América “idealizada” e perdida, possivelmente aquela buscada por Donald Trump e seus seguidores, e que esconde também um lado sombrio e degradado na sua moralidade distorcida. Ainda nesse aspecto existencial, mesmo a visão sobre a questão racial na produção é marcada por uma originalidade surpreendente, em que a pró-atividade dos personagens negros na defesa de sua integridade física-moral foge dos caminhos óbvios de uma hipócrita saída conciliadora, além do fato de que o racismo dos vilões da trama esconde na sua gênese uma admiração pela própria figura do negro (afinal, por que os personagens brancos escolheriam passar o resto de suas vidas dentro dos corpos de afro-americanos?). No mais, a narrativa é marcada por encenação e atmosfera elaboradas a partir de uma uma dinâmica tensa e brutal, beirando por vezes o barroco e o delirante nas nuances visuais de algumas sequências. 

sexta-feira, junho 09, 2017

Controle remoto, de Jeff Lieberman ****

Na década de 80, um nicho expressivo de diretores e produções dentro do gênero fantástico se dedicaram a uma espécie de reciclagem/homenagem a filmes B de terror e ficção-científica dos anos 50. É só lembrar de alguns dos trabalhos mais expressivos da época de diretores como Joe Dante e John Landis. Uma obra como “Controle remoto” (1988) é outro exemplar enfático dessa tendência. O diretor Jeff Lieberman recria os preceitos formais e temáticos mais caros de antigos filmes sobre invasões alienígenas sob uma ótima ainda mais sarcástica e perversa tanto na elaboração de uma produção pastiche fake de ficção científica cinquentista que serve como mote principal da trama quanto em termos de atmosfera e encenação da história que se desenvolve numa época mais contemporânea – nesse sentido, é de se destacar a estranheza e sordidez da ambientação de algumas cenas e a criatividade das brutais e hilárias sequências de ação. Algumas passagens do roteiro podem soar paródicas e exageradas, mas acabam ganhando uma perturbadora dimensão dramática devido a tensa narrativa arquitetada por Lieberman. Nas mãos do cineasta, mesmo algumas interpretações canastronas do elenco e alguns dilemas datados do roteiro se incorporam com naturalidade e coerência em uma lógica artística muito particular.

quinta-feira, junho 08, 2017

O cidadão ilustre, de Mariano Cohn e Gastón Duprat ***

A sequência inicial de “O cidadão ilustre” (2016), em que o escritor Daniel Mantovani (Oscar Martínez) recebe o Nobel da literatura, pauta o grande dilema existencial do roteiro do filme dirigido por Mariano Cohn e Gastón Duprat – a do real papel da arte no mundo contemporâneo. O texto raivoso e amargurado do discurso proferido pelo protagonista durante o evento evidencia o medo de uma estagnação criativa e da incapacidade de sua escrita gerar algum incômodo ao status quo vigente. Assim, quando a narrativa passa a se concentrar no ambiente da cidadezinha no interior da Argentina onde Mantovani nasceu, e que serviu de maior fonte de inspiração para as histórias de seus livros, a produção ganha um tom de fábula perversa, por vezes até kafkaniana na sua caracterização de pesadelo, em que o personagem principal, inicialmente convidado pela prefeitura local para ser homenageado, se embrenha em um crescente vórtice de sentimentos nada nobres por parte dos habitantes da cidade (mascarados por um hipócrita manto de cordialidade): invejas, ressentimentos, obscurantismo, mesquinharias, repressão moral e interesses escusos das oligarquias locais. Diante de tais situações, Mantovani é contraditório e ambíguo em suas ações e sentimentos, mas de tais elementos fica tangível um humanismo que se contrapõe ferozmente contra o opressor patriarcalismo político-cultural da sua aparentemente pacata cidade natal. Ainda que por vezes “O cidadão ilustre” caia em algumas caracterizações caricatas e simplistas e que o seu formato seja o de uma comédia dramática convencional, a obra de Cohn e Duprat tem momentos instigantes e memoráveis pela forma com que expõe a condição entre o ridículo e o assustador da sociedade contemporânea, reafirmando a função da arte e da cultura em desafiar tais aspectos deletérios da humanidade.

quarta-feira, junho 07, 2017

Rei Arthur - A lenda da espada, de Guy Ritchie **1/2

O diretor britânico Guy Ritchie forjou uma peculiar linguagem autoral em seus primeiros trabalhos, principalmente quando enveredava pelo gênero policial. Quando embarcou de vez no “cinemão” comercial norte-americano, dedicou-se a releituras modernizadas de figuras literárias (“Sherlock Holmes”), televisivas (“O agente da U.N.K.L.E.”) e míticas – nesse último caso, enquadra-se sua produção mais recente, “Rei Arthur – A lenda da espada” (2017). Em algumas passagens do filme, principalmente em seu terço inicial, pode-se perceber algumas características típicas de seu estilo, como os diálogos prolixos e a edição repleta de cortes rápidos. Com o desenvolver da narrativa, entretanto, sua marca autoral vai ficando cada vez mais diluída em nome de uma síntese artística despersonalizada e convencional em excesso, em que a história do Rei Arthur (Charlie Hunnam) parece se adequar a fórmulas de mercado. Por vezes, há a impressão de que se está se assistindo a uma produção de super-heróis da Marvel ou da DC situada na Inglaterra de séculos atrás. Se alguém estiver interessado em assistir a uma obra realmente de peso versando sobre as aventuras de Arthur, é melhor ficar mesmo com a obra-prima definitiva sobre o assunto, o poético e vigoroso “Excalibur” (1981) de John Boorman.

terça-feira, junho 06, 2017

1974: A possessão de Altair, de Victor Dryere ***

Dentro do gênero do horror de “câmera subjetiva”, onde as filmagens são “registradas” pelos próprios personagens da trama, a produção mexicana “1974: A possessão de Altair” (2016) não atinge os mesmos níveis de criatividade e concisão narrativa do espanhol “REC” (2008), mas se mostra bem mais instigante do que os mais recentes exemplares da franquia “Atividade paranormal” e derivados norte-americanos. A explicação pela sua maior relevância artística está na concepção e execução de um convincente conceito temático-estético. O fato da trama se desenvolver em meados dos anos 70 e de que grande parte das gravações serem feitas em Super 8 faz com que o filme tenha uma atmosfera que transite com fluidez entre o real e o onírico e uma direção de fotografia e arte que surpreende pela beleza visual rústica e nostálgica de algumas sequências. O roteiro cai em alguns convencionalismos inerentes ao gênero, mas o tratamento formal e narrativo tem a precisão suficiente para gerar tensão e interesse para o espectador.

segunda-feira, junho 05, 2017

Vermelho russo, de Charly Braun ***

O roteiro e a estrutura narrativa de “Vermelho russo” (2016) partem de premissas de uma estranha síntese entre o simples e o sofisticado: a partir de uma trama que acolhe experiências reais das atrizes Maria Manoella e Martha Nowill, há uma encenação que combina intimismo, metalinguagem e trejeitos de cinema documental, com as referidas intérpretes nos papéis de si mesmas. No cerne desse conceito formal-temático está uma lúcida reflexão sobre o papel da arte e da cultura na vida das pessoas. O curso sobre o método Stanislavski de interpretação que Maria e Martha vão fazer em Moscou desencadeia um processo de questionamento existencial para elas, onde indagam sobre os rumos profissionais que tomaram, as suas escolhas sentimentais e mesmo o significado da amizade entre elas. A narrativa é marcada pela concisão, alcançando uma interessante atmosfera que varia com naturalidade de uma consistente carga dramática para a comicidade sutil. Além disso, elementos do teatro e da literatura se incorporam de maneira fluida dentro da linguagem estética do filme, valorizando ainda mais as nuances dramáticas e irônicas do roteiro.