segunda-feira, janeiro 31, 2011

Sentimento de Culpa, de Nicole Holofcener ***


A diretora Nicole Holofcener se iniciou no meio cinematográfico trabalhando em filmes de Woody Allen como assistente de produção e edição. Pela sua filmografia, pode-se observar que essa convivência deixou marcas no modus operandi da diretora. “Sentimento de Culpa” (2009) é reflexo de tal influência, com o filme tendo aquele aspecto de crônica de costumes que o cineasta novaiorquino tanto preza. Mesmo não tendo o mesmo apuro formal e a perspicácia irônica de Allen, e com uma quedinha por um certo sentimentalismo excessivo, Holofcener consegue obter sequências memoráveis em se tratando de mordacidade para retratar as relações e sentimentos humanos. Além disso, sabe valorizar as nuances dramáticas apresentadas pelo seu bom elenco, com destaque para Rebecca Hall e Oliver Platt. Ou seja, naquele período de espera de um ano em que se aguarda por uma produção de Allen, “Sentimento de Culpa” pode ser visto como uma espécie de aperitivo.

quinta-feira, janeiro 27, 2011

Biutiful, de Alejandro González Iñárritu ***


Depois de explorar a exaustão em seus filmes a fórmula de histórias paralelas aparentemente aleatórias que se entrecruzam na conclusão de suas tramas, o diretor mexicano Alejandro González Iñárritu opta em “Biutiful” (2010) por uma narrativa mais simplificada, tanto que há um protagonista bem definido, o picareta sensitivo Uxbal (Javier Barden), ainda que vários personagens e situações transitem ao seu redor. O filme se apresenta como um drama ora social ora intimista, com toques fantásticos, advindos do fato de Uxbal poder ver os mortos. E são os momentos irreais que reservam as melhores surpresas desta produção espanhola, com Iñárritu obtendo um efeito perturbador por trazer um registro bastante cru de fantasmas que assolam as visões de Uxbal. O insólito em “Biutiful” está justamente na contraposição que se faz desse aspecto metafísico com a dura realidade do personagem principal que envolve dificuldades financeiras, relação conturbada com ex-mulher, tensões com imigrantes ilegais e, para finalizar o rosário de desgraças, a descoberta que está com os dias contados devido a um câncer recém-diagnosticado. Na abordagem do cineasta, não há uma grande diferenciação entre esses planos de realidade (o físico e do além), estabelecendo-se uma relação intrínseca entre eles (o que faz com que “Biutiful” esteja longe da seara do gênero horror – a tensão pelo sobrenatural vem mais dos tormentos existenciais de Uxbal do que pela presença das assombrações).

Ainda que não traga o vigor narrativo e estético de “Amores Brutos” (2000), a obra de estreia de Iñárritu, “Biutiful” mostra o diretor buscando diferentes concepções formais, o que é bem vindo depois da estagnação criativa de “Babel”(2006).

quarta-feira, janeiro 26, 2011

A Morte e Vida e Morte de Charlie, de Burr Steers **1/2


Este é tipo de filme que muito espectador descartaria logo de cara e com dois motivos consideráveis: o protagonista é interpretado por um insípido ídolo juvenil e a temática espírita do roteiro (afinal, como não ficar traumatizado depois de “Chico Xavier” e “Nosso Lar”?). Driblando esses contratempos, entretanto, “A Morte e Vida de Charlie” (2010) apresenta qualidades insuspeitas. O diretor Burr Steers apresenta certa ambição artística em alguns de seus planos, com direito, inclusive, a bem tramados planos-sequência e épicas tomadas aéreas. O fato de boa parte da trama se desenvolver no ambiente de um cemitério dá margens a uma direção de fotografia que impressiona numa caracterização visual que apresenta traços irreais ou oníricos. As sequências que se desenvolvem no ambiente aquático, tanto em regatas quanto em tempestades marítimas, também demonstram domínio de Steers na ação cinematográfica. O excessivo ranço sentimental e os pueris momentos românticos atravancam a narrativa, mas no saldo final “A Morte e Vida de Charlie” faz com que Steers seja um nome a se conferir trabalhos vindouros.

terça-feira, janeiro 25, 2011

As Viagens de Gulliver, de Rob Letterman *1/2


A ideia inicial desta versão cinematográfica mais recente de “As Viagens de Gulliver” (2010) até que parecia promissora: adaptar o clássico literário juvenil para um contexto contemporâneo e tendo o irreverente Jack Black no papel-título. O resultado prático, entretanto, é desastroso. Como aventura, o filme é mal desenvolvido, incapaz de gerar tensão no sentido de que várias situações da trama são apresentadas quase como um resumo (a impressão que se tem é de uma obra que perdeu cenas importantes no corte). O que poderia salvar a produção seriam os efeitos especiais, na combinação do live action com as trucagens de digitalização, mas a concepção visual dessa interação é tosca, pouco convincente mesmo. Se fossem utilizados maquetes ou stop motion, pelo menos o visual poderia ser bonito... No mais, há aquela sensação constante de um filme realizado a toque de caixa, o que fica evidenciado no próprio roteiro, recheado de momentos que eram para serem satíricos, mas apenas conseguem mesmo é serem constrangedores pela falta de graça, com direito, inclusive, a coreografias vagabundas de fazer inveja a programa infantil brasileiro. O próprio Jack Black soa burocrático nas suas piadas cheias de referências à cultura pop (culpa do Nick Hornby que institucionalizou que é cool fazer esse tipo de citações).

segunda-feira, janeiro 24, 2011

Enrolados, de Nathan Greno e Byron Howard ***1/2


De certa forma, pode-se dizer que “Enrolados” (2010) obedece a uma fórmula, em que se combina um conto de fadas clássico e uma abordagem contemporânea de filmes de ação (não é à toa, por exemplo, em que uma determina sequência se faça uma evocação a uma cena antológica do “Missão Impossível” de Brian De Palma). Essa aparente junção insólita de gêneros, entretanto, acaba se mostrando orgânica no seu resultado final. A animação mais recente da Disney empolga quando deixa a aventura desenfreada predominar, em momentos que nos fazem lembrar o melhor da franquia de Indiana Jones e até mesmo algumas histórias do quadrinhista Carl Barks para o Tio Patinha e o restante da Família Pato. A se destacar ainda o velho padrão de excelência dos Estúdios Disney na qualidade do traço do desenho, com destaque absoluto para a caracterização visual do vale e do torre onde vive a protagonista Rapunzel, trabalho esse tão detalhista que remete a uma verdadeira pintura. No mais, o roteiro é bem trabalhado em termos de delineamento das situações e dos carismáticos personagens, a começar pelo salteador Flynn Rider (uma bela homenagem a várias das figuras de aventureiros vividas pelo mítico Errol Flynn), a sensual vilã Gothel (no tradicional estilo de maléfica que combina repulsa e atração) e a própria Rapunzel, que transita com desenvoltura entre a inocência delicada e a sagacidade.

sexta-feira, janeiro 21, 2011

Desenrola, de Rosane Svartman **1/2


Quando fez um retrato autobiográfico de sua adolescência em “Os Incompreendidos” (1959), François Truffaut expôs sentimentos e situações que são recorrentes a todos os jovens que se encontram nessa fase da vida, independente de época, raça e classe social: imaturidade, revolta, incoerência, confusão. Talvez aí esteja a explicação da perenidade artística do longa de estreia do diretor francês. E também é provável que esse seja o ponto de desequilíbrio de “Desenrola” (2011). O que era para ser uma despretensiosa comédia dramática de ambientação juvenil acaba patinando por querer ser um retrato fiel de um certo tipo de juventude: contemporâneos adolescentes classe média no Rio de Janeiro. E daí dá-lhe depoimentos “espontâneos” de meninas sobre virgindade e cenas da garotada com a cabeça enfiada nos computadores. Essa necessidade de excessiva contextualização de época é algo que torna o filme já datado no momento imediato de seu lançamento. O filme só goza de alguma naturalidade quando parte sem cerimônia para o clima pueril de “boys meet girls”, chegando a lembrar em algumas seqüências alguns dos clássicos oitentistas do gênero dirigidos/produzidos pelo saudoso John Hughes como “Gatinhas e Gatões” (1984) e “A Garota de Rosa-Shocking” (1986) – aliás, referências aos anos 80 pontuam todo o filme. Pena que as boas sacadas de “Desenrola” acabam obscurecidas pelas necessidades antropológicas da produção.

P.S.: sabemos que hoje em dia para se realizar um filme no Brasil é preciso o apoio de patrocinadores, mas precisava fazer umas propagandas tão descaradas de curso de inglês e refrigerante??

quinta-feira, janeiro 20, 2011

O Louco Amor de Yves Saint Lauren, de Pierre Thoretton ***


A minha expectativa para este documentário francês era considerável. E neste sentido, é impossível não valorizar o trabalho de um bom trailer, pois o do filme em questão é mais do que eficiente em atrair o espectador a assistir ao mesmo, valorizando muito, em uma ágil edição, os bastidores dos desfiles e o relacionamento do cinebiografado com o mundo ao seu redor. Ocorre que “O Louco Amor de Yves Saint Lauren” (2010) traz um enfoque mais intimista, privilegiando a visão da vida de Saint Lauren pelo olhar de seu viúvo Pierre Bergé, além de dar uma excessiva atenção à gigantesca coleção de objetos de arte do casal, em longos e contemplativos planos de tal material. Por maior que seja a importância dos mencionados objetos, fazer deles quase que um personagem a parte torna a narrativa do documentário mais arrastada do que o necessário, fazendo com que se deixe de mostrar detalhes que seriam mais relevantes. Incomoda também que a perspectiva de Bergé sobre o amado traz um certo ranço conservador e moralista, tanto sobre o caráter hedonista de Saint Lauren como ao explorar o surrado dilema “como um artista tão talentoso podia ser tão atormentado pessoalmente”. Mesmo com essas restrições, entretanto, “O Louco Amor de Yves Saint Lauren” é um documentário indispensável para se assistir pelo fato de retratar a trajetória de um indivíduo fundamental para se entender a história da cultura ocidental nas últimas décadas, tanto que a produção mostra Saint Lauren inserido em movimentos marcantes como o Maio de 68 e a dionisíaca cena musical e comportamental das discotecas nos anos 70.

quarta-feira, janeiro 19, 2011

O Mágico, de Sylvain Chomet ****


Em um primeiro momento, a animação “O Mágico” (2010) soa obviamente como uma homenagem a Jacques Tati. Não só por encenar um roteiro inédito do comediante francês, mas também por recriar com atilado lirismo boa parte do universo “tatiano”. A começar pelo personagem-título, que reproduz com perfeição os trejeitos e esquisitices do Senhor Hulot (a mais famosa criatura concebida por Tati). Mimetiza-se também vários dos recursos estéticos de obras-primas como “As Férias do Sr. Hulot” (1953) e “Meu Tio” (1958), apostando-se no humor quase que puramente visual e na inexistência de diálogos. É interessante notar também que no roteiro há um certo teor sentimental e melancólico que evoca alguns clássicos de Charlie Chaplin como “O Garoto” (1921) e “Luzes da Cidade” (1931). O diretor Sylvain Chomet, entretanto, não abdica de aplicar seu toque pessoal em “O Mágico”, o que se evidencia na beleza do traço da produção, que varia sutilmente entre um realismo pleno de detalhes na composição de cenas e pequenos toques que beiram o impressionismo pictórico. Mais do que apenas reciclar os cânones da filmografia de Tati, “O Mágico” explora com eficácia as possibilidades criativas que o cinema mudo oferece em termos de narrativa. Por mais que haja um caráter nostálgico no filme, o seu resultado final é absolutamente atemporal.

terça-feira, janeiro 18, 2011

O Primeiro Que Disse, de Ferzan Ozpetek **


O diretor Ferzan Ozpetek, turco radicado na Itália, já havia abordado a questão do homossexualismo com mais contundência em “Um Amor Quase Perfeito” (2001). Em “O Primeiro Que Disse” (2010), sua encenação carece de personalidade e foco. O cineasta fica indeciso entre uma visão dramática e séria sobre os conflitos de seus personagens e o caráter anedótico e estereotipado de alguns momentos (o que fica bem evidente quanto entram em cena os amigos gays do protagonista Tommaso). Tal confusão se estende também nas próprias escolhas formais da narrativa da produção, principalmente quando se estabelece uma estética típica do realismo fantástico que parece não se encaixar com o estilo naturalista com que Ozpetek conduz o filme em boa parte da sua duração. O diretor até consegue fazer prevalecer em algumas sequências uma certa elegância no filmar, principalmente quando passado e presente se fundem com sutileza. No restante de “O Primeiro Que Disse”, entretanto, predomina a mão pesada e a falta de rumo de Ozpetek. O equivocado final em aberto é reflexo claro disso.

segunda-feira, janeiro 17, 2011

Além da Vida, de Clint Eastwood ***


Minha bronca com “Chico Xavier” e “Nosso Lar”, produções brasileiras de temática espírita, não eram com a “mensagem” em si, mas com as escolhas formais equivocadas de seus realizadores. Em “Além da Vida” (2010), Clint Eastwood prova que pode se extrair algo de interessante dessa temática. O diretor não está preocupado com doutrinações e afins, utilizando elementos da cultura espírita mais como pano de fundo para uma trama de teor fantástico. Logo na abertura, o filme impressiona com a recriação do episódio do Tsunami, em cenas marcantes de destruição e morte (apesar dos efeitos digitais serem um pouco toscos em alguns momentos). Depois, Eastwood recorre a um recurso até meio manjado de três tramas que se desenvolvem em paralelo até se entrecruzarem, todas tendo como elemento comum experiências com o pós-morte. Mesmo marcado por um certo convencionalismo estético excessivo, o diretor consegue envolver com sua narrativa de ritmo sereno. Assim, apesar desta obra menor e distante da perfeição de obras-primas como “Os Imperdoáveis” (1992) e “Sobre Meninos e Lobos” (2003), Eastwood se mostra ainda acima da média da maioria de seus pares norte-americanos.

quinta-feira, janeiro 13, 2011

Abutres, de Pablo Trapero ***


A exemplo de outros filmes recentes no cenário argentino, “Abutres” (2010) procura equacionar uma temática social dentro de um gênero tradicional como o policial. Desta forma, há uma certa queda do cineasta Pablo Trapero pelo registro naturalista, quase documental, em algumas tomadas do filme. Em outros momentos, há um lado intimista em “Abutres” que é bastante explorado, enfatizando-se os conflitos e dilemas existenciais/amorosos dos protagonistas Sosa (Ricardo Darin) e Luján (Margina Gusman). Essa diversidade nos tratamentos estéticos e temáticos no filme é que lhe dão um aspecto despersonalizado, com a impressão de Trapero atirando para todos os lados. “Abutres” realmente engrena na sua metade final, quando o foco passa a ser primordialmente a de uma trama policial. A produção afunda o pé na jaca em termos de violência, ação e ambientação sórdida, como todo bom exemplar do gênero. Trapero estabelece com competência um clima de permanente tensão e desespero, além de coreografar de forma marcante cenas envolvendo colisões, atropelamentos, tiroteios e espancamentos, conseguindo fazer de Darin um legítimo anti-herói carismático e azarado, que não consegue passar 15 minutos sem ser arrebentado por alguém (como manda a boa tradição dos personagens principais de películas noir).

quarta-feira, janeiro 12, 2011

Entrando Numa Fria Ainda Maior Com a Família, de Paul Weitz **1/2


A explicação do bode de boa parte de crítica e público com “Entrando Numa Fria Maior Ainda Com a Família” (2010) pode ser encontrada em alguns aspectos. Um deles claramente viria da decepção daqueles cinéfilos ao constatarem como um trio de atores experientes como Robert De Niro, Dustin Hoffman e Harvey Keitel (imagina o que seria esses três em alguma produção típica dos anos 70) pode ser tão sub-aproveitado (Keitel, inclusive, tem um papel que beira o nível figurante). Há também a questão de ser irritante ver que o terceiro filme da franquia reprisa sem cerimônia a estrutura da trama dos dois filmes anteriores. Apesar destes problemas, é inegável que o diretor Paul Weitz conseguiu criar uma obra razoável em termos cômicos. Mesmo com tantos medalhões em cena, a produção não se constrange em abusar de recursos de comédia grosseira e levemente escatológica, com direito a cenas envolvendo vômitos, violência, maltratos infantis e piadas sexuais, mas também preserva uma certa ironia sutil na sua visão sobre os valores tradicionais pequeno-burgueses. É claro também que as referências e citações a filmes emblemáticos como “O Poderoso Chefão” e “Tubarão” podem soar óbvias (olha aí o cinema setentista de novo mencionado), mas não deixam de ser um recurso estético eficiente.

terça-feira, janeiro 11, 2011

Incontrolável, de Tony Scott ***


O cineasta inglês radicado nos Estados Unidos Tony Scott é um dos maiores responsáveis pela consolidação de um estilo de filmar dentro do gênero dos filmes de ação desde a década de 1980 (como não lembrar de “Top Gun”?). Com produções repletas de tiroteios ou perseguições com veículos em alta velocidade (carros, motos, aviões, trens, submarinos e o que mais der na veneta), Scott consolidou uma estética de uma profusão de cortes rápidos e fotografia estourada. Em “Incontrolável” (2010), sua obra mais recente, o cineasta se mostra até mais contido no seu modus operandi frenético de montagem, mas isso afeta pouco na sua habitual narrativa veloz. Por mais que se critique Scott de ser uma espécie de operário padrão de Hollywood, é inegável que o homem é mais que eficiente em angulosos enquadramentos, movimentos precisos de câmera e na combinação impactante de imagem e som. A forma, por exemplo, com que filma em determinados momentos o trem em disparada é impressionante no sentido de que a câmera lenta e o barulho imponente do veículo dão uma impressão de um verdadeiro monstro de ferro com vida própria. O diretor pode não trazer novidades para a linhagem dos “filmes-catástrofes”, mas entrega um produto que honra a tradição.

segunda-feira, janeiro 10, 2011

Machete, de Robert Rodriguez *1/2


Em “Planeta Terror” (2007), sua contribuição no projeto “Grindhouse”, o cineasta Robert Rodriguez conseguia fazer sua homenagem ao gênero exploitation usando uma série de recursos estéticos, sem abdicar, contudo, de oferecer uma narrativa cinematográfica que conquistava pela tensão e pela ambientação ironicamente sórdida. Espécie de continuação dessa viagem conceitual de Rodriguez, “Machete” (2010) acaba se revelando uma produção bem inferior ao seu predecessor. Talvez o grande equívoco do diretor no filme esteja no fato de que a sua emulação de uma forma de filmar na linha exploitation tenha resultado num filme mal dirigido de forma proposital. Ou seja, um trash consentido (o que por si só já é um grande contra-senso). Assim, tem-se uma montagem que parece ter sido feita com um facão, além de sequências de ação encenadas e editadas em um nível que beira o amador, o que é decepcionante quando se sabe que Rodriguez já se mostrou em outras oportunidades (“El Mariachi”, “A Balada do Pistoleiro”, “Sin City”) um diretor com boa mão para o gênero de aventura. É claro que há idiossincrasias que geram algum interesse para os cinéfilos em geral, como a violência cartunesca, a escalação do “feio, sujo e malvado” Danny Trejo como protagonista (e consequente herói e galã) e um elenco mais que esquisito formado por medalhões (Robert De Niro), canastrões decadentes (Don Johnson, Steve Segal, Jeff Fahey), beldades hollywoodianas (Jessica Alba, Lindsay Lohan) e tipos esquisitos/cult (Tom Savini, Cheech Marin). No final das contas, entretanto, isso acaba refletindo a verdadeira natureza de “Machete”: idéias bem sacadas, mas muito mal desenvolvidas e executadas que geram uma obra enfadonha.

quinta-feira, janeiro 06, 2011

72 Horas, de Paul Haggis ***


Sempre achei “Crash – No Limite” (2004), a oscarizada obra de estréia de Paul Haggis como diretor, um filme superestimado. Com uma concepção formal de comercial de sabonete e uma narrativa mosaico influenciada de forma pálida por Robert Altman, aliadas a uma trama pretensamente questionadora dos valores da sociedade ocidental (mas com uma sutileza de elefante numa loja de cristais), a produção acabou se tornando até referência no cinema contemporâneo. Desprovido deste “hype” e de estéreis afetações estéticas e temáticas, “72 Horas” (2010), filme mais recente de Haggis, apresenta uma linguagem cinematográfica mais apurada. Girando em torno de um gênero bem definido (produções sobre fugas de prisão), o diretor constrói uma obra de constante tensão que trafega com desenvoltura em uma ambientação de drama familiar com tinturas melodramáticas até o estilo policial, com direito a cenários soturnos e cenas impactantes de violência. Haggis ousa também nas sequências de ação com um preciso trabalho de edição, com destaque absoluto para os momentos com Liam Neeson em cena, na pele de um especialista em fugas da prisão, em que a montagem encaixa a narração classuda deste último com tomadas do personagem de Russel Crowe colocando em prática os ensinamentos de seu “mestre”.

quarta-feira, janeiro 05, 2011

Tron - O Legado, de Joseph Kosinski ***

Sou do time que nunca achou “Tron – Uma Odisséia Eletrônica” (1982) uma obra-prima ou coisa do gênero. É claro que o filme é referencial no sentido de evidenciar um ponto de evolução nos efeitos especiais da época em que foi lançado, mas por isso mesmo ele ganhou um aspecto muito datado com o passar do tempo. Assim, não achei uma heresia que mais de 25 anos depois houvesse uma continuação para a obra. “Tron – O Legado” (2010) também não chega a ser uma produção clássica, mas mesmo assim tem qualidades que saltam aos olhos. A forma com que cenários naturais e os atores interagem com os cenários e efeitos digitais é bastante orgânica, não fazendo com que o filme pareça um longo vídeo game. Nesse sentido, as sequências de ação surpreendem por uma edição limpa e ágil, que faz com que no meio de cenários virtuais e sombrios não se perca a noção do que acontece em cena. De se destacar ainda os temas instrumentais da trilha sonora composta e tocada pelo duo francês Daft Punk, em perfeita sintonia com o caráter de futurismo retrô do filme.

segunda-feira, janeiro 03, 2011

Oceanos, de Jacques Perrin e Jacques Cluzaud ***


Este documentário francês sobre a vida nos oceanos, em um primeiro momento, não se diferencia muito daquelas produções que abordam aspectos da natureza, com fins ecológicos, que freqüentemente são exibidos nas televisões (abertas ou pagas). Aos poucos, entretanto, “Oceanos” (2009) mostra a sua real dimensão. As imagens grandiosas dos mares revoltos e a esquisitice visual de boa parte fauna marinha filmada (com peixes, moluscos e afins que parecem vir de um mundo paralelo), ao olhar de um leigo espectador de cinema, encontram paralelos com o universo do cinema fantástico (e, quem sabe, podem ir até mais além). Essa impressão se acentua ainda mais quando se perceber a inserção de alguns efeitos digitais, traçando um sutil conflito entre a verdade e o truque cinematográfico.