segunda-feira, setembro 21, 2009

Nome Próprio, de Murilo Salles ***1/2


Confesso que nunca gostei dos escritos de Clarah Averbuck. A impressão que tenho assistindo a “Nome Próprio” (2008), produção brasileira baseada nos livros “Máquina de Pimball” e “Vida de Gato”, é que Murilo Salles também tem a mesma opinião... O interesse do cineasta não é exatamente pelo texto em si da obra literária de Averbuck, mas na conexão que se dá entre esse texto e a própria vida da autora. Vemos a vida desregrada de Camila, alter ego da escritora, e a forma com que esse caos se transforma em literatura.

Salles explora ambigüidades ao extremo. Vai do hedonismo sensual da intensa vida íntima da protagonista até momentos de profunda solidão e abandono. Camila também consegue ser selvaticamente sexy e encantadora em determinadas seqüências e em outras se converte em uma deprimente e neurótica desmiolada que enche o saco de todo mundo. A dicotomia atração e repulsa parece ser a força motriz do que Camila escreve e também é a base conceitual de “Nome Próprio”. Salles administra essa verdadeira montanha russa de sensações e sentimentos com maestria, indo do registro simples e de tons naturalistas do quotidiano atribulado de Camila até a uma busca por uma linguagem experimental, principalmente quando procura fundir cinema e literatura ao dar visibilidade às palavras sendo tecladas diretamente no que está enquadrado pela câmera. Sua narrativa é envolvente e também perturbadora: parece questionar constantemente o modus operandi de Camila, além de progressivamente, através de pequenos detalhes cênicos, confundir o próprio espectador sobre a “verdade” daquilo que estamos assistindo – será que Camila realmente viveu tudo aquilo ou é apenas ela se transformando cada vez mais em ficção??

Salles também foi particularmente feliz ao escolher Leandra Leal para o papel de Camila. A atuação da atriz é de uma dimensão quase de possessão: intensa e feroz, mas também transpirando fragilidade emocional, Leal busca a naturalidade a qualquer preço – sua expressividade não é apenas facial, mas totalmente corporal (poucas vezes se viu uma atriz ficar tanto tempo nua como se fosse algo tão natural). A impressão é que ela conseguiu ser mais Clarah Averbuck que a própria Clarah!

Por falar nela, dizem que Averbuck ficou descontente com o resultado final de “Nome Próprio”. Ora, ela devia agradecer ao Salles por ter sua obra revigorada de forma tão extraordinária!

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