terça-feira, setembro 21, 2010

Uma Noite em 67, de Renato Terra e Ricardo Calil ***


A esta altura do campeonato, já deu para perceber que a importância desses documentários brasileiros sobre música que vêm aparecendo com frequência nos cinemas não está principalmente em suas concepções formais, mas sim nas intenções quase didáticas de falar sobre episódios, obscuros ou não, da história cultural de nosso país. Dentro dessa perspectiva, “Uma Noite em 67” (2010) se mostra uma produção satisfatória. Esteticamente, os diretores Renato Terra e Ricardo Calil não inventam muito, fazendo o básico com competência: combinam um farto e precioso material de arquivo com depoimentos ora reveladores, ora apenas anedóticos, de alguns daqueles que participaram do Festival da Record de 1967, evento esse que apresentou grandes clássicos do cancioneiro brasileiro como “Ponteio” (Edu Lobo), “Roda Viva” (Chico Buarque), “Domingo no Parque” (Gilberto Gil) e “Alegria Alegria” (Caetano Veloso). Essa certa previsibilidade em termos de estrutura narrativa, entretanto, não quer dizer que “Uma Noite em 67” não apresente alguns diferenciais. O principal deles está no sutil perfil desmistificador sobre tais fatos antológicos. Mesmo mostrando que boa parte das canções participantes do festival refletia as preocupações políticas e sociais dos seus autores e público em relação a ditadura militar que dominava o país na época, há também a visão sobre a posição sectária e obscurantista da platéia “engajada” que vaiava impiedosamente as músicas e artistas que não correspondiam às suas expectativas, numa atitude quase tão autoritária quanto a ditadura que tanto abominavam, o que fica ainda mais graves quando se observa que um dos cantores que sofreram apupos do público foi o já tarimbado Sérgio Ricardo, simplesmente o cara que fez a brilhante trilha de “Deus e o Diabo na Terra do Sol” (1964). Não deixa de ser uma tremenda ousadia propor uma abordagem pouco maniqueísta como essa colocada por Terra e Calil, o que credencia “Uma Noite em 67” como um peculiar programa cinematográfico. Mas aqueles que não se interessam por tais considerações temáticas podem simplesmente assistir ao filme para assistir as contundentes apresentações das músicas acima citadas, mostradas na íntegra no filme.

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