quinta-feira, junho 23, 2011

Turnê, de Mathieu Amalric ****



Há em “Turnê” (2010) uma série de referências que permeiam toda a trama e a estética do filme: o jogo de atração e repulsa pela cultura norte-americana que sempre marcou a filmografia de Wim Wenders, o gosto pelo grotesco e alegórico de Fellini, um certo pendor por uma visão existencialista da vida típico de parte da cinematografia francesa. A junção de todos esses elementos, entretanto, não se limita a uma mera colcha de retalhos desconexa. O diretor/ator Mathieu Amalric consegue dar uma coesão admirável para tal diversidade de influências, conseguindo, ao mesmo tempo, oferecer uma linguagem própria e instigante.

A trama de “Turnê” pode parecer meio estapafúrdia, mas carrega uma simbologia fascinante: um decadente empresário francês do ramo artístico (Amalric) resolve dar uma cartada final ao promover uma turnê pelo interior de seu país com um grupo burlesco de artistas performáticas dos Estados Unidos. A narrativa do filme é fascinante na forma como revela os detalhes e segredos do roteiro e dos personagens através de pequenos gestos, diálogos, fragmentos de situações mal resolvidas. As criaturas de Amalric são outsiders, que oscilam entre picaretas e frustrados, mas carregam uma estranha carga de fascínio e sensualidade. O registro visual acentua ainda mais esse sentimento de ambigüidade ao misturar uma abordagem que varia sem cerimônia entre o documental e o mágico – nesse último caso, principalmente nas apresentações das cantoras/dançarinas, em números musicais que combinam uma estética algo nostálgica de cabaret com temas musicais pop mais contemporâneos (imaginem na mesma embalagem Marilyn Monroe, a garageira sessentista dos Sonics e as baladas metal dramáticas do Aerosmith). E em tempos que tanto se fala em cultura pop, uma obra como “Turnê” acaba sendo bastante emblemática nesse sentido.

Nenhum comentário: