quinta-feira, outubro 21, 2010

1/2 Mensch, de Sogo Ishii ****


A banda alemã Einsturzende Neubaten é o mais expressivo representante do rock industrial, vertente que tem como mote a incorporação de ruídos ambientais modernos como matéria-prima musical. No caso do Neubaten, o gênero é levado ao extremo, pois a banda tem como sustentáculo de suas canções uma junção contundente e sem concessões de guitarra distorcida com percussão em objetos metálicos. Com o passar dos anos, eles incorporaram instrumentos mais tradicionais, como sintetizadores, mas com resultados sempre distantes dos convencionalismos melódicos e harmônicos. O filme “1/2 Mensch” (1986) é uma tradução visual perfeita da música da banda. Seus momentos iniciais se desenvolvem em um formato de documentário, com o Einsturzende Neubaten tocando em uma fábrica abandonada, sem a presença de público (a não ser a equipe técnica das filmagens). Materiais enferrujados e há anos sem uso vão sendo incorporados aos arranjos de densas canções. O cenário desolador, a música esquizóide e a postura sombria e nada comunicativa dos membros da banda resultam num registro de impacto visual e sonoro impressionantes e fazem de “1/2 Mensch” uma versão antípoda e sinistra de “Live at Pompeii” (1971), o célebre filme-concerto do Pink Floyd em que eles se apresentam nas ruínas de Pompéia. Ocorre, entretanto, que o diretor Sogo Ishii não se contenta em apresentar os germânicos apenas nesse contexto documental, experimentando também no formato de um vídeo musical, onde os músicos, ainda dentro da mencionada fábrica, interagem com uma espécie de teatro kabuki de figurinos esfarrapados e com seqüências inspiradas em horror gore. Não contente com esses delírios estéticos, Ishii retrata o Neubaten em ação num concerto “normal”, com presença de platéia, mas sempre realçando a relação da performance da banda com o conceito de dissolução da sociedade moderna, em que a banda incorpora o lixo dessa última, transforma o mesmo em música e a joga ferozmente em direção ao público/sociedade. Por fim, os nossos protagonistas tocam em meio a um cenário apocalíptico estilizado e irreal, fazendo de sua música a trilha sonora para um planeta em processo de colapso. Essa variante de estilos e gêneros num mesmo filme pode confundir a cabeça dos espectadores mais desavisados, mas está em notável sintonia com o universo musical e conceitual do Einsturzende Neubaten, em que se oferece uma caótica e desestruturada arte como o reflexo de um mundo em desintegração.

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