Em seus últimos trabalhos, o diretor alemão Christian
Petzold elaborou uma instigante síntese narrativa, em que preceitos
convencionais do gênero melodrama e de filmes de época se entrelaçam com
discretas nuances de estilização. “Em trânsito” (2018), sua obra mais recente,
radicaliza essa particular concepção artística. O roteiro tem fortes vínculos
com a escola de realismo, mas encenação e direção de arte formulam um universo
existencial paralelo – a trama até deixa claro que se situa na tomada da França
pelos alemães na 2ª Guerra Mundial, só que figurinos e a caracterização
ambiental são contemporâneas. A simbologia é simples, quase óbvia, e também
altamente eficaz, ao fazer a relação com os procedimentos de perseguição étnica
e social adotadas pelos nazistas com as práticas desumanas na atualidade de
ataques xenofóbicos a imigrantes e em outras ações de opressão econômica-social
por parte de vários governos no mundo ocidental contemporâneo. Ao longo da
narrativa, a abordagem temática-estética de Petzold vai se revelando cada vez
mais intrincada, fazendo com que elementos literários e teatrais sejam
inseridos e demonstrem fluências na fusão com a própria linguagem
cinematográfica da obra. São notáveis, por exemplo, as sequências em que a
narração over mostra uma sintonia frágil com aquilo que está em cena, como se
soubesse apenas fragmentos da história que está sendo contada. Tal concepção
realça ainda mais a complexidade dos personagens e situações do roteiro,
reforçando uma visão poética e fatalista em relação àquilo que está em cena.
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