segunda-feira, março 10, 2014

A terra das almas errantes, de Rithy Panh ***1/2

A premissa temática do documentário cambojano “A terra das almas errantes” (1999) é bastante interessante: uma grande corporação de comunicação pretende instalar fios óticos para instalação de internet por uma vasta extensão territorial do Camboja e para isso contrata vários nativos para escavar e enterrar o material em questão. Ao registrar esse processo, o diretor Rithy Panh concebe um assustador e contundente retrato da miséria e atraso que assolam aquele país há anos. O cineasta não recorre à narração over e nem a uma ostensiva trilha musical – seu estilo de filmar e editar é seco, colhendo documentários dos trabalhadores e imagens deles trabalhando e em atos cotidianos. A partir do evento chave da atividade exploratória de uma mão-de-obra rústica, o filme desenvolve uma aguçada perspectiva política e social do país, em que as chagas de uma nação marcada por guerras e ditaduras são expostas com crueza e raiva. Nesse sentido, Panh não se furta em chocar o espectador, com imagens de mutilados de guerra laborando de forma intensa, pessoas com mãos e pés lacerados e inchados pelo trabalho sem condições de segurança, indivíduos desesperados com a remuneração irrisória que recebem pelos seus esforços. De certa forma, há um ácido tom irônico na narrativa de “A terra das almas errantes”, contrastando a intenção de modernizar o país pela implantação da internet com o ato arcaico de explorar paupérrimos trabalhadores através de uma jornada desumana e mal remunerada de trabalho incessante.

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