segunda-feira, março 24, 2014

Eles voltam, de Marcelo Lordello ***


Confesso que uma coisa não ficou clara em “Eles voltam” (2011) para mim – por várias vezes, os diálogos ficam incompreensíveis, ou simplesmente inaudíveis, tanto pelo fato dos ruídos ambientais estarem mixados de forma alta como pela situação das conversas entre os personagens serem proferidas num volume mais baixo. Na realidade, a própria dicção de boa parte dos atores não colabora muito para o entendimento. Não sei se isso ocorreu por algum problema no áudio da sala em que assisti ou foi por opção estética mesmo do diretor Marcelo Lordello. Também é fato, entretanto, que tal aspecto não dificulta muito a compreensão existencial da obra em questão. Através de uma narrativa minimalista e de uma direção de fotografia expressiva, Lordello estabelece uma espécie de parábola moral do Brasil contemporâneo. A saga de garota pequeno burguesa Cris (Maria Luiza Tavare) que é abandonada numa estrada do sertão nordestino e fica errando por cidadezinhas e famílias humildes acaba ganhando uma conotação de uma pequena viagem pelo Brasil profundo, mostrando com certa contundência os contrastes tanto entre o urbano e o rural quanto entre as classes sociais, equilibrando a trajetória da amadurecimento pessoal de Cris com a sua própria compreensão de uma sociedade desigual e em conflito. A crueza da encenação proposta por Lordello, com um elenco de atores amadores e abordagem formal de tons documentais, acentua ainda mais a visão ácida e lúcida do filme sobre as relações humanas na sociedade brasileira.

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