segunda-feira, julho 28, 2014

Vic+Flo viram um urso, de Denis Còté ***1/2


Depois do amorfo “Curling” (2009), o diretor canadense Denis Còté consegue conceber um formalismo mais vigoroso em “Vic+Flo viram um urso” (2013). Em seus primeiros momentos, a obra mantém uma atmosfera rarefeita, investindo num intimismo de talhe clássico envolvendo tanto a difícil adaptação à sociedade da ex-presidiária Victoria (Pierrette Robitaille) quanto o seu conturbado relacionamento lésbico com Florence (Romane Bohringer). A trama se desenvolve num microcosmo que abrange o pequeno sítio em que a protagonista mora e a cidade interiorana que fica perto de sua residência, com Cóté construindo uma narrativa de tons simbólicos a retratar questões como a inadequação social e o preconceito moral. Aos poucos, entretanto, a trama vai ganhando contornos mais sombrios no gênero suspense, principalmente quando entra em cena Jackie/Marina (Marie Brassard), uma sorridente e brutal psicopata, descambando no seu terço final para um misto de erotismo mórbido, demência e violência. A ambiência doentia da obra acaba resultando em algo entre o onírico e o delirante, mas com Còté nunca abdicando de uma estética de fotografia límpida e montagem se alternando em tomadas fixas e discretos planos-sequência, sendo que esse contraste entre clareza formal e temática nebulosa resulta num sensorialismo perturbador.