sexta-feira, outubro 17, 2014

O soro do mal, de Frank Henenlotter ****


Assim como David Cronenberg, quando esse enveredava para o gênero horror, o diretor norte-americano Frank Henenlotter em seus filmes de terror sempre buscou uma temática ligada ao corpo humano e suas pulsões de desejo e morte, ao invés de se ligar na temática tradicional nesse tipo de produções. Assim, a tônica dominante de sua filmografia foi a escatologia e estranhas aberrações. Ao contrário de Cronenberg, entretanto, a atmosfera do melhor da obra de Henenlotter é marcada por um humor um tanto escrachado e por doses de violências mais explícitas, combinação essa típica da época de ouro do horror oitentista. “O soro do mal” (1988) marca o auge de tais concepções artísticas particulares de Henenlotter. Tudo aquilo que já havia sido burilado no clássico “Basket Case” (1982) aflora com uma intensidade perturbadora – as condições modestas de recurso acabam se tornando um trunfo diante da criatividade do cineasta na utilização de seus recursos, fazendo com que o filme tenha um estranho e constante clima de decadência e sordidez. O impacto dos efeitos especiais quase artesanais, distantes do realismo estéril do digital, acentuam ainda a desconcertante sensação ambígua entre o riso e a tensão dramática que permeia a trama. Nessa levada, o roteiro se desenvolve como um pesadelo urbano, com a ação evoluindo em prédios decrépitos e bares bagaceiros e ressaltando o aspecto mitológico singular de Nova Iorque, em que a mesma cidade que atrai pelas suas luzes e glamour também seduz pela ambiência de decadência e hedonismo, mostrando-se o cenário perfeito para o conto moral sangrento engedrado por Henenlotter, que combina com equilíbrio contundente na mesma narrativa desejo, morte, senso de humor doentio e melancolia. Nesse sentido, “O soro do mal” talvez seja a melhor tradução audiovisual da música selvagem e perversa de nomes fundamentais do cenário roqueiro nova-iorquino como Suicide, James Chance e Dead Boys.

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