quarta-feira, outubro 22, 2014

Viva a liberdade, de Roberto Andò ***


O diretor italiano Roberto Andò formata “Viva a liberdade” (2013) a partir de uma estrutura narrativa convencional de uma comédia de erros. A trama focaliza as confusões e enganos provocados por dois gêmeos, um senador em crise existencial e um professor recém saído de uma clínica psiquátrica, que por condições aparentemente involuntárias do destino acabam trocando de lugar. Num primeiro momento, o conflito do roteiro navega por um clichê básico – as diferenças de temperamento e concepções de vida dos irmãos seriam o mote principal da graça e do sentido do filme. Ocorre, entretanto, que com o desenrolar da trama esse conceito vai ficando cada vez mais difuso. Elementos do passado dos protagonistas vem à tona sutilmente e revelam que a força da relação dos dois talvez esteja nas semelhanças filosóficas e culturais que os unem. Esse tom obscuro da narrativa torna a obra cada vez mais intrigante e acaba evidenciando um notável caráter simbólico do filme, em que a complexidade do relacionamento entre os irmãos e também com aqueles que os rodeiam refletem a própria condição singular da política e da sociedade italianas. Dessa forma, não é por acaso que em determinado momento da produção aparece um vídeo do mestre Fellini desancando autoridades e políticas: os delírios fellinianos pairam como discreta influência dentro das curiosas soluções estéticas e temáticas estabelecidas por Andò em “Viva a liberdade”.