terça-feira, março 20, 2012

Shame, de Steve Mcqueen ****



Talvez o tema polêmico de “Shame” (2011), a compulsão sexual, faça supor que a sua maior ousadia esteja na sua trama. Nesse sentido, até acho que a abordagem do filme sobre o assunto não seja algo tão provocador assim. É claro que há cenas fortes envolvendo sexo, mas há algo de moralista na visão do roteiro – as obsessões eróticas do protagonista Brandon Sullivan (Michael Fassbender) possuem um viés muito mais patológico do que sensual. De certa forma, pode-se até pensar numa conotação católica em tal visão, pois o personagem vive imerso num incômodo e constante sentimento de culpa por sua luxúria. E o paradoxismo entre culpa e prazer não chega a ser exatamente uma novidade, não só no cinema como em outras formas de expressões artísticas... O que faz “Shame” transcender como obra cinematográfica é a brilhante encenação concebida pelo diretor Steve McQueen. Enquadramentos e montagem compõem uma atmosfera fria e sufocante para o inferno moral de Brandon. Essa combinação entre distanciamento emocional e vigor narrativo gera seqüências impactantes, principalmente naquelas que envolvem as aventuras sexuais do protagonista – destituídos de qualquer grau de romantismo, tais momentos são perturbadores ao expor uma certa crueza do ato sexual. McQueen estende seus particulares fundamentos formais também para a direção de atores: Fassbender e Carey Mulligan (essa no papel da frágil irmã de Brandon) oferecem composições dramáticas viscerais para seus personagens, obtendo um notável equilíbrio entre a contenção e a explosão.

No mais, “Shame” se mostra em sintonia com o filme anterior de McQueen, “Fome” (2008), outra produção de evidente inquietação artística, o que já sugere uma espécie de unidade autoral na curta e expressiva filmografia do cineasta.

Nenhum comentário: