segunda-feira, fevereiro 24, 2014

Nebraska, de Alexander Payne ***1/2


Em 1982, o cantor e compositor Bruce Springsteen lançou o álbum “Nebraska”, um de seus melhores trabalhos e provavelmente seu disco mais triste e anti-comercial. Em despojadas baladas, o músico procurava fazer um inventário de figuras e situações que se referiam a um estado de espírito especifico, versando sobre estradas, desajustados em geral, relações mal resolvidas. A influência do disco foi tão marcante na cultura norte-americana que se tornou uma referência não apenas no cancioneiro do país como também se estendeu a outros meios de expressão. Em 1991, por exemplo, o ator Sean Penn estreou na direção com “Unidos pelo sangue”, obra comovente que se inspirava na canção “Highway Patrolman”, um dos pontos altos da obra-prima de Springsteen. Confesso que não sei se “Nebraska” (2013), de Alexander Payne, tem alguma relação direta com o disco em questão, mas sua atmosfera sóbria e a direção de fotografia em preto e branco parecem uma extensão existencial daquela obra de Springsteen. Por outro lado, o filme de Payne tem personalidade própria e que se mostra em sintonia artística com a cinematografia do diretor – na realidade, é seu melhor trabalho desde a sua estréia, “Eleições” (1999). A trama se formata como uma crônica sobre os sonhos perdidos, a falta de perspectivas e a mediocridade dos habitantes de cidades sem graça e desoladas do interior dos Estados Unidos. O roteiro da produção, entretanto, injeta insólitas doses de ironia e bom humor, fazendo com que “Nebraska” não caia na aridez temática e formal. Mesmo a redenção que oferece aos principais personagens na sua conclusão não soa forçada ou como concessão, mas como um sutil toque emocional que engrandece ainda mais a dimensão humana de tais figuras. No mais, Payne embala essa pequena saga familiar com alguns elementos formais expressivos, como a direção de fotografia que busca enquadramentos e iluminação que emulam um efeito pictórico na linha de um Norman Rockwell às avessas, além de da trilha sonora climática e acústica baseada em temas folk e country que acabam lembrando (sem querer ou não?) o próprio “Nebraska” de Springsteen.

Um comentário:

Marcelo Castro Moraes disse...

Um filme com uma linguagem cinematográfica setentista. Muito show.