“O mercado de notícias” (2014) marcou uma espécie de ruptura
na carreira de Jorge Furtado como diretor de longas-metragens. Ao invés de
filmes baseados em uma desgastada fórmula de diálogos espertinhos e narrativa
frouxa beirando o paródico involuntário, o cineasta passou a lançar filmes
marcados pela sobriedade estética e roteiros mais densos em termos de
construção dramática e discurso de subtexto. “Rasga coração” (2018) é uma
continuação dessa tendência de maturidade artística por parte de Furtado. Por
ser baseada em uma peça teatral, por vezes a confluência narrativa entre cinema
e teatro se mostra um tanto truncada, principalmente pelo fato da marcação
cênica nesses momentos se revelar um pouco engessada. Em outras sequências,
entretanto, o diretor consegue acertar o tom no choque entre os dois meios de
expressão e a narrativa se mostra fluente e mesmo com um estranho encanto. O
roteiro brinca com alguns clichês temáticos básicos (conflito de gerações,
desilusões ideológicas) e lhes dá uma roupagem dinâmica e contundente, além de
um bem-vindo caráter de ambiguidade na construção de personagens e situações.
Contribui também para esse direcionamento artístico uma direção de arte e concepção
cênica que não se atrelam de maneira plena ao realismo, investindo de maneira
pontual em um olhar estilizado tanto na evocação do passado quanto na interação
entre os personagens. De certa forma, essa abordagem de Furtado demonstra
sintonia com aquela tramada por Spike Lee no também recente “Infiltrado na Klan”
(2018), em que aparentes ingenuidade e idealização na encenação e trama escondem
na verdade um retrato vigoroso de um ordenamento sócio-político injusto e
opressor. Valorizado ainda por algumas ótimas atuações em seu elenco, “Rasga
coração” surpreende por se revelar como a obra mais exuberante e sensual de
Furtado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário