terça-feira, dezembro 11, 2018

Rasga coração, de Jorge Furtado ***


“O mercado de notícias” (2014) marcou uma espécie de ruptura na carreira de Jorge Furtado como diretor de longas-metragens. Ao invés de filmes baseados em uma desgastada fórmula de diálogos espertinhos e narrativa frouxa beirando o paródico involuntário, o cineasta passou a lançar filmes marcados pela sobriedade estética e roteiros mais densos em termos de construção dramática e discurso de subtexto. “Rasga coração” (2018) é uma continuação dessa tendência de maturidade artística por parte de Furtado. Por ser baseada em uma peça teatral, por vezes a confluência narrativa entre cinema e teatro se mostra um tanto truncada, principalmente pelo fato da marcação cênica nesses momentos se revelar um pouco engessada. Em outras sequências, entretanto, o diretor consegue acertar o tom no choque entre os dois meios de expressão e a narrativa se mostra fluente e mesmo com um estranho encanto. O roteiro brinca com alguns clichês temáticos básicos (conflito de gerações, desilusões ideológicas) e lhes dá uma roupagem dinâmica e contundente, além de um bem-vindo caráter de ambiguidade na construção de personagens e situações. Contribui também para esse direcionamento artístico uma direção de arte e concepção cênica que não se atrelam de maneira plena ao realismo, investindo de maneira pontual em um olhar estilizado tanto na evocação do passado quanto na interação entre os personagens. De certa forma, essa abordagem de Furtado demonstra sintonia com aquela tramada por Spike Lee no também recente “Infiltrado na Klan” (2018), em que aparentes ingenuidade e idealização na encenação e trama escondem na verdade um retrato vigoroso de um ordenamento sócio-político injusto e opressor. Valorizado ainda por algumas ótimas atuações em seu elenco, “Rasga coração” surpreende por se revelar como a obra mais exuberante e sensual de Furtado.

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