Em um primeiro momento, “As viúvas” (2018) pode aparentar ser
mais um filme rotineiro na linha “um assalto perfeito”. A presença de Steve
McQueen na direção, entretanto, afasta bastante o longa do lugar comum. Sua
abordagem narrativa é fortemente sóbria, evitando excessos óbvios e
desnecessários – nesse sentido, por exemplo, é de se observar como a elegante
trilha sonora pontua com discrição e sensibilidade as sequências mais tensas da
obra. Em essência o filme realmente pertence ao gênero policial de ação, mas
sabe valorizar a densidade dramática dos momentos mais intimistas e a
caracterização psicológica consistente de seus personagens. O roteiro apresenta
um subtexto bem delineado e lúcido em seus contornos sócio-políticos e mesmo de
contestação aos valores de uma sociedade patriarcal. E o que coroa essas boas
soluções artísticas da obra é a encenação minuciosa de McQueen, tanto nas
sequências de ação marcadas por um detalhismo visual e coreográfico
impressionante quanto nas cenas focadas em diálogos rascantes. Todo esse rigor
formal e narrativo acaba gerando algumas passagens antológicas, como aquele
plano-sequência em que o político em campanha Jack Mulligan (Colin Farrell)
percorre um trajeto em que vai de uma praça popular no centro de Chicago, onde
fazia um comício, até a sua burguesa casa em uma zona nobre da cidade, em
expressiva simbologia audiovisual a sinalizar de maneira contundente uma
equação baseada em demagogia, alienação e exploração sócio-econômica. No mais, “As
viúvas” também pode servir como um alento para aqueles que estão sentindo falta
daqueles filmes policiais mistos de casca-grossa e cerebrais que o mestre
Michael Mann tanto gosta de fazer.
Um comentário:
Gostei de "As viúvas", André. Mas meu favorito do McQueen ainda é "12 anos de escravidão". Tua evocação de Michael Mann me deu vontade de rever alguns filmes dele.
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