quinta-feira, junho 25, 2015

Cala a boca, Philip, de Alex Ross Perry ***


Vários aspectos de “Cala a boca, Philip” (2014) remetem ao universo literário. O mais óbvio seria a da própria temática do filme – a trama foca nas desventuras sentimentais e sociais do jovem escritor em ascensão Philip Lewis (Jason Schwartzman), além de mostrar sua relação de aprendizado artístico e existencial com o veterano autor consagrado Ike Zimmerman (Jonathan Pryce). Alguns elementos do roteiro são referências a escritores e situações específicos, indo desde a notória arrogância sarcástica de Philip Roth até o perturbador suicídio de David Foster Wallace. Essa ligação da produção com a literatura se estende também para a sua estrutura formal. Uma constante narração over na terceira pessoa “explica” ações externas e internas do seu protagonista, como se ele fizesse parte de uma espécie de romance de formação filmado. Em um primeiro momento, tal recurso pode parecer um tanto preguiçoso, no sentido de parecer necessário que tudo aquilo que esteja em cena fosse explicado. A intenção real, entretanto, é bem diversa e mais criativa. Seria um reflexo estético do próprio egocentrismo do personagem principal, em que as descrições e tergiversações da voz narrativa dariam uma certa grandiosidade intimista para eventos corriqueiros e mesmo mesquinhos que envolvem o cotidiano de Philip. Essa boa sacada formal do diretor Alex Ross Perry reforça a forte dimensão humanista de sua obra, no sentido de se estabelecer um contraponto entre essa visão autocentrada do personagem com a percepção “de fora” de quem assiste ao filme. As ações e reações de Philip e demais indivíduos que o cercam apresentam um desenvolvimento psicológico e comportamental convincente, e que também foge de padrões moralistas simplificadores. Por mais egoístas e megalomaníacos que Philip e Ike possam ser, há de convir que suas posturas perante o mundo também expõem com crueza e lucidez as inseguranças e mediocridades daqueles que o cercam. E talvez as constatações irônicas e amargas de Ike sejam a melhor síntese do subtexto de “Cala a boca, Philip”: a de que o amadurecimento dos indivíduos não se relaciona de forma necessária a uma consequência de eles se tornarem pessoas “melhores”, mas que simplesmente aceitem a sua negatividade como inevitável e a de que possam a converter em força criativa.

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