Se em “Deixe a luz acesa” (2012) e “O amor estranho” (2014)
se podia perceber delineando um traço personalíssimo no cinema do diretor
norte-americano Ira Sachs, em “Melhores amigos” (2016) esse particular estilo
se cristaliza de forma plena e extraordinária. A partir de uma estrutura
narrativa que sintetiza melodrama classicista e trejeitos de um formalismo
livre e instintivo que remetem ao melhor da obra de John Cassavetes, a produção
mais recente de Sachs fascina o espectador pela beleza de sua estética sóbria e
pela pungência de sua abordagem emocional. O roteiro, dentro de um formato de
crônica de costumes, evoca em seu subtexto temas como conflito de classes,
dilemas intimistas, questionamentos entre gerações e crítica de valores numa
sociedade patriarcal e pequeno-burguesa, e consegue lhes dar uma unidade existencial
admirável. E mesmo a questão da homossexualidade, já trazida nos citados filmes
anteriores, entra de maneira discreta e ambígua, refletindo uma certa atmosfera
libertária para a obra. A encenação precisa é fundamental dentro dessa proposta
de Sachs, conciliando preceitos realistas e tensão dramática. Esse conjunto
temático-formal, na realidade, expressa uma fascinante dicotomia dentro da
visão artística de Sachs para “Melhores amigos”, em que boa parte da narrativa predomina
um forte rigor no conjunto fotografia, edição e encenação, mas que em momentos
cruciais se permite um certo tom intuitivo e espontâneo, principalmente quando
a dupla de adolescentes protagonista está em cena, vide as sequências antológicas
dos exercícios de interpretações teatrais e da festa eletrônica juvenil.
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