De vez em quando aparece alguma produção que mostra que o
cinema argentino contemporâneo é bem mais que melodramas bem-comportados
estrelados por Ricar do Darin. “Minha amiga do parque” (2015) é uma dessas
obras de exceção. O filme da atriz, roteirista e atriz Ana Katz começa de
maneira beirando o previsível, ao mostrar o cotidiano da protagonista Liz
(Julieta Zylberberg) e seu filho ainda bebê enquanto o marido está viajando a
trabalho. Aos poucos, a narrativa vai ganhando contornos de maior tensão e
mistério, principalmente no momento que entra em cena Rosa (Katz). É como se Liz
ingressasse em um universo à parte, em que as regras de convivência “civilizada”
tipicamente pequeno-burguesas se dissolvessem de forma sutil e perversa. Por
mais que os modos e atitudes atribulados de Rosa perturbem Liz, há uma
perturbadora atração dessa última por essa vida instável e mais desafiadora dos
padrões vigentes. A encenação proposta por Katz para essa intimista saga
existencial evita o óbvio e o maniqueísta, valorizando pequenos gestos e
silêncios expressivos entre as personagens. A forte densidade dramática e a
discreta ironia da trama também são valorizadas pela crueza imagética da
direção de fotografia, pelo intenso ritmo narrativo e pelas viscerais
interpretações de Katz e Zylberberg.
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