Ainda que a direção de
“Visages, villages” (2017) seja compartilhada com o fotógrafo e artista
plástico JR, o filme em questão é uma obra que diz muito mais respeito ao
universo autoral da cineasta Agnès Varda. JR tem a sua importância em termos
estéticos e existenciais para a produção, mas o que dita realmente os caminhos criativos
da narrativa são as inquietações e concepções particulares de Varda. Os sutis
choques entre os preceitos documentais com truques de encenação, as
reminiscências pessoais da cineasta, suas admirações particulares e convicções
sócio-políticas – tais elementos são estabelecidos com delicadeza por Varda,
com JR usando sua própria arte para dar vazão a eles. No cômputo geral, não chega
a ser um trabalho especialmente arrebatador, com uma narrativa que flui
tranquila e por vezes quase como devaneio por um conceito etéreo de uma França
profunda que fica em uma zona entre o nostálgico e o irreal. As obsessões
formais e artísticas da dupla de diretores se fundem por vezes como uma coisa
só e dão ensejo a algumas boas sacadas imagéticas. Há um tom crepuscular que
paira sobre a narrativa, afinal é provável que se trate do último filme dirigido
por uma Varda já algo combalida pela idade e a saúde mais frágil, o que faz com
que um aspecto de sentimentalismo domine algumas cenas. Isso, entretanto, nasce
e se manifesta com coerência e espontaneidade, estando bem longe do apelativo.
Se Godard hoje em dia ainda mantém a preocupação em romper com os ditames de “normalidade”
da linguagem cinematográfica, Varda quer apenas dedicar seus últimos esforços
criativos para evocar um passado que ama e manifestar suas admirações. “Visages,
villages” é um exemplar pungente de seus desejos.
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