O fato do diretor Tom Ford ser também um estilista renomado
está evidente em cada fotograma de “Animais noturnos” (2016). A sequência
inicial de créditos, por exemplo, faz um contraste perturbador entre o grotesco
da dança de obesas mórbidas seminuas com a ambientação requintada que as cerca,
marcando a oposição visual entre a beleza e a feiura. Mesmo quando a trama
envereda nas passagens com os rednecks “feios, sujos e malvados” há um forte
grau de estilização da sordidez. Dentro dessa sua concepção artística, Ford
constrói uma narrativa ambiciosa e irregular. Num primeiro momento, o filme
parece emular uma espécie de síntese bizarra de David Lynch e Federico Fellini,
em que a edição fragmentada e a caracterização bizarra e caricata de
personagens e situações insinuam uma atmosfera onírica/delirante. Aos poucos,
entretanto, roteiro e encenação se estabilizam para uma direção oposta, com o filme
se convertendo para um melodrama barroco que se desenvolve em duas frentes
temporais (passado e presente) e mesmo dimensionais (com a história do romance que
é lido pela protagonista Susan se entrecruzando com a “realidade” da personagem).
Há pontos positivos nas escolhas artísticas de Ford – a conotação de perversa
parábola moral do roteiro, a expressiva beleza plástica de algumas sequências,
trilha sonora de temas marcantes, ótimas atuações no elenco. O problema é que
todas essas qualidades por vezes esbarram numa narrativa exageradamente bombástica
e pouco sutil, e que em alguns momentos até resvala no francamente brega e
novelesco, não havendo aquele contraponto de ironia que fazia “A garota
exemplar” (2014), obra de temática e estética semelhantes, transcender como
obra extraordinária. Ainda assim, boa partes de tais equívocos são frutos de ousadias
formais e textuais de Ford e juntamente com os já aludidos acertos da produção
credenciam “Animais noturnos” como uma inquietante experiência cinematográfica.
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