domingo, janeiro 15, 2017

Animais noturnos, de Tom Ford ***

O fato do diretor Tom Ford ser também um estilista renomado está evidente em cada fotograma de “Animais noturnos” (2016). A sequência inicial de créditos, por exemplo, faz um contraste perturbador entre o grotesco da dança de obesas mórbidas seminuas com a ambientação requintada que as cerca, marcando a oposição visual entre a beleza e a feiura. Mesmo quando a trama envereda nas passagens com os rednecks “feios, sujos e malvados” há um forte grau de estilização da sordidez. Dentro dessa sua concepção artística, Ford constrói uma narrativa ambiciosa e irregular. Num primeiro momento, o filme parece emular uma espécie de síntese bizarra de David Lynch e Federico Fellini, em que a edição fragmentada e a caracterização bizarra e caricata de personagens e situações insinuam uma atmosfera onírica/delirante. Aos poucos, entretanto, roteiro e encenação se estabilizam para uma direção oposta, com o filme se convertendo para um melodrama barroco que se desenvolve em duas frentes temporais (passado e presente) e mesmo dimensionais (com a história do romance que é lido pela protagonista Susan se entrecruzando com a “realidade” da personagem). Há pontos positivos nas escolhas artísticas de Ford – a conotação de perversa parábola moral do roteiro, a expressiva beleza plástica de algumas sequências, trilha sonora de temas marcantes, ótimas atuações no elenco. O problema é que todas essas qualidades por vezes esbarram numa narrativa exageradamente bombástica e pouco sutil, e que em alguns momentos até resvala no francamente brega e novelesco, não havendo aquele contraponto de ironia que fazia “A garota exemplar” (2014), obra de temática e estética semelhantes, transcender como obra extraordinária. Ainda assim, boa partes de tais equívocos são frutos de ousadias formais e textuais de Ford e juntamente com os já aludidos acertos da produção credenciam “Animais noturnos” como uma inquietante experiência cinematográfica.

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