Assim como ocorre em “Eu, Daniel Blake” (2016), a produção
italiana “As confissões” (2015) mostra contundente ressonância com o cenário sócio-político
contemporâneo mundial. O diretor Roberto Andò já havia mostrado uma queda para
a sátira política em “Viva a liberdade” (2013), mas nessa obra recente a sua
abordagem se revela mais sombria e complexa. A trama tem na sua superfície uma
formatação tradicional para o suspense. Ocorre, entretanto, que a história de
mistério envolvendo o suicídio do presidente do FMI durante o encontro num
imenso hotel luxuoso e isolado com os ministros da economia dos países mais
ricos do mundo na verdade vai se configurando aos poucos como uma ácida parábola
moral a refletir o descaso do Estado neoliberal e a ganância de grandes corporações
e bancos diante do interesses de sobrevivência da maioria da população mundial.
Mesmo a figura do protagonista, o monge Roberto Salus (Toni Servillo), tem o
caráter simbólico de servir como uma espécie de consciência existencial,
parecendo uma homenagem ao papel desempenhado atualmente pelo Papa Francisco. A
direção de Andò demonstra segurança e até uma certa ousadia na forma com que
contrasta a opulência visual dos cenários com a podridão ética dos personagens
e algumas situações, além de algumas sequências mostrarem uma expressiva síntese
entre a ironia e o fantástico. É de se destacar também as ótimas composições
dramáticas nas interpretações de Servillo e Daniel Auteuil. Alguns detalhes do
roteiro e determinadas nuanças estéticas fazem lembrar filmes italianos clássicos
no gênero político como “Juízo final” (1976) e “Saló ou os 120 dias de Sodoma”
(1976), o que pode até causar alguma frustração, pois Andò está bem distante de
mostrar a mesma profundidade psicológica e formalismo peculiar de Elio Petri e Pier
Paolo Pasolini. Ainda assim, “As confissões” é uma obra capaz de inquietar os
espectadores pela força de sua narrativa e pela lucidez crítica de sua visão de
mundo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário