Por vezes, o diretor Matt Ross se rende a algumas convenções
melodramáticas e a alguns óbvios truques narrativos que tiram um pouco da força
sensorial de “Capitão fantástico” (2016). Ainda assim, o filme tem um resultado
final memorável, principalmente por algumas ousadias de forte empatia. A começar
pela síntese entre crueza e forte plasticidade na forma com que o seu registro
visual retrata uma natureza selvagem e a interação dos personagens com esse
cenário, chegando a lembrar o estilo do alemão Werner Herzog nesse tipo de
concepção cênica. É admirável também o trabalho de direção de atores, em que a
fluidez e expressividade das interpretações de Viggo Mortensen e do elenco de
adolescentes e criança rendem cenas antológicas pela dinâmica da interação
entre eles. O roteiro do filme também configura um ponto alto para a narrativa,
no sentido do inusitado de algumas passagens, na complexidade psicológica e
existencial na caracterização de alguns personagens, na verve irônica e
contestadora de boa parte dos diálogos e de um saudável teor libertário do
subtexto – nesse sentido, “Capitão fantástico” apresenta sintonia artística e
temática com uma das obras-primas da temporada, “A bruxa”, pela contundência e
lucidez de um discurso anticristão. E para coroar os acertos da produção, há
uma belíssima trilha sonora que combina com precisão temas etéreos
encantadores, cortesia dos islandeses do Sigur Ros, e ótimas canções rock. Diante
do obscurantismo e reacionarismo que tomaram conta do cenário
sócio-político-cultural no mundo em 2016, o caráter sardônico e desafiador de “Capitão
fantástico” acaba lhe dando uma efetiva transcendência artística.
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