quarta-feira, maio 03, 2017

Pitanga, de Camila Pitanga e Beto Brant ***

Alguns dias atrás, um amigo meu comentou um fato curioso (e assustador) para mim – ele estava em um evento social, cujo predomínio era de pessoas entre 30 e 35 anos, todos de classe média, e em determinado momento boa parte deles entrou em uma animada discussão “cultural” onde se vangloriavam de nunca terem lido um livro na vida (claro, fora aqueles que foram obrigados a ler para se formar em suas respectivas faculdades). No mesmo dia em que fiquei sabendo de tal fato, fui ao cinema assistir ao documentário brasileiro “Pitanga” (2016). Nas sequências iniciais do filme, o foco fica no ambiente familiar do protagonista Antônio Pitanga, e até se fica com a impressão de que o que predominará na produção seria um incômodo tom hagiográfico do cinebiografado. Tal impressão, entretanto, acaba se mostrando enganosa com o desenrolar da narrativa. Através de trechos dos principais filmes dos quais Pitanga participou e dos depoimentos de vários nomes fundamentais do meio artístico e intelectual do Brasil dos últimos 60 anos, o que o documentário dirigido por Camila Pitanga e Beto Brant faz não é apenas o relato da trajetória pessoal e profissional de Antônio Pitanga (o que por si só já seria algo fascinante), mas também o inventário existencial de toda uma geração extraordinária de grandes nomes do cinema, música, literatura, teatro, política, religião e outros meio de expressão cultural. A grande profusão de depoentes pode até parecer exagerada, mas na realidade tem a função de mostrar a riqueza e diversidade artística e intelectual de um certo imaginário cultural-filosófico tipicamente brasileiro. O contraste entre a obtusidade dos rapazes contemporâneos mencionados no início desse texto e o fervilhante complexo de ideias e sentimentos expressos em “Pitanga” ajuda a explicar o nosso atual conturbado e deprimente panorama político-social.

Um comentário:

Gabriel disse...

Filme incrível, parabéns pela postagem.