Alguns dias atrás, um amigo meu comentou um fato curioso (e
assustador) para mim – ele estava em um evento social, cujo predomínio era de
pessoas entre 30 e 35 anos, todos de classe média, e em determinado momento boa
parte deles entrou em uma animada discussão “cultural” onde se vangloriavam de
nunca terem lido um livro na vida (claro, fora aqueles que foram obrigados a
ler para se formar em suas respectivas faculdades). No mesmo dia em que fiquei
sabendo de tal fato, fui ao cinema assistir ao documentário brasileiro “Pitanga”
(2016). Nas sequências iniciais do filme, o foco fica no ambiente familiar do
protagonista Antônio Pitanga, e até se fica com a impressão de que o que
predominará na produção seria um incômodo tom hagiográfico do cinebiografado.
Tal impressão, entretanto, acaba se mostrando enganosa com o desenrolar da
narrativa. Através de trechos dos principais filmes dos quais Pitanga
participou e dos depoimentos de vários nomes fundamentais do meio artístico e intelectual
do Brasil dos últimos 60 anos, o que o documentário dirigido por Camila Pitanga
e Beto Brant faz não é apenas o relato da trajetória pessoal e profissional de
Antônio Pitanga (o que por si só já seria algo fascinante), mas também o
inventário existencial de toda uma geração extraordinária de grandes nomes do
cinema, música, literatura, teatro, política, religião e outros meio de
expressão cultural. A grande profusão de depoentes pode até parecer exagerada,
mas na realidade tem a função de mostrar a riqueza e diversidade artística e
intelectual de um certo imaginário cultural-filosófico tipicamente brasileiro.
O contraste entre a obtusidade dos rapazes contemporâneos mencionados no início
desse texto e o fervilhante complexo de ideias e sentimentos expressos em “Pitanga”
ajuda a explicar o nosso atual conturbado e deprimente panorama
político-social.
Um comentário:
Filme incrível, parabéns pela postagem.
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