Apesar de sua trama se concentrar na figura do protagonista
Christian (Claes Bang), a narrativa de “The square – A arte da discórdia”
(2017) tem algo de fragmentada, com as situações do roteiro se sucedendo quase
de forma episódica, por vezes beirando uma espécie de anedotário dos absurdos e
ridículos da sociedade europeia do século XXI. A própria configuração
psicológica do personagem principal obedece a um direcionamento que sintetiza
simbolismo e caricatura – ele é o protótipo do macho branco ocidental
civilizado que por trás de uma máscara de gentileza e erudição esconde
mesquinharias e preconceitos. Nessa levada, a proposta artística-existencial do
filme dirigido por Ruben Östlund fica embretada entre uma forte veia irônica e
um viés humanista, com uma trama que se pretende a retratar os principais
dilemas políticos, sociais e culturais da Europa contemporânea. Por vezes, a
pretensão do cineasta cai em obviedades e simplificações excessivas,
principalmente na forma jocosa e conservadora com que expõe sua visão sobre as
artes plásticas e conceituais dos últimos anos. Nesse sentido, por exemplo, o
extraordinário romance “O mapa e o território” de Michel Houellebecq apresenta
um subtexto mais lúcido e aprofundado sobre o papel da arte no mundo atual. “The
square” tem seus momentos mais memoráveis quando abdica do seu tom discursivo e
embarca numa abordagem mais delirante e nebulosa, vide a antológica sequência
em que um artista emula o comportamento de um selvagem pré-histórico em um refinado
jantar para um público refinado e endinheirado, em um enlouquecido happening
levado às últimas consequências.
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