Assim como o
documentário “Cinema novo” (2016) teve a sua estrutura narrativa formatada de
acordo com os preceitos artísticos do movimento cinematográfico que focalizou, “Torquato
Neto – Todas as horas do fim” (2017) é uma obra documental que parece se
configurar como uma canção típica da Tropicália, momento cultural do qual seu
biografado foi um dos principais nomes. A ordenação de fatos e depoimentos que
surgem na tela se dão dentro de um ordenamento linear e cronológico
tradicional. Essa sugestão de convencionalismo, entretanto, é logo embaralhada
pelo direcionamento conceitual proposto pelos diretores Eduardo Ades e Marcus
Fernando. O que é passado (imagens de arquivo) e presente (depoimentos atuais
sobre Torquato) vão se fundindo a partir de recursos e truques narrativos,
fazendo com que o protagonista se mostre como uma figura pertencente a uma
outra dimensão temporal e existencial. Não à toa, as filmagens contemporâneas
recebem um tratamento visual estilizado, dando uma ideia de sujeira imagética, reforçada
ainda pelo desencontro entre áudio e imagem. O truque pode ser simples, quase
barato, mas o efeito sensorial é desconcertante, bastante em sintonia com a própria
natureza artística de Torquato. Tal abordagem do documentário respeita e
valoriza a própria complexidade da arte e personalidade de seu principal personagem
– ao invés de procurar respostas fáceis para os triunfos e descaminhos na trajetória
de Torquato, ressalta ainda mais os aspectos inquietantes e misteriosos para a
sua arte e vida pessoal. Mais do que se limitar a um mero caráter informativo, “Todas
as horas do fim” joga o espectador dentro de um caleidoscópio
sonoro-poético-visual belíssimo e atordoante.
Boa parte de amigos e conhecidos costuma dizer que as minhas recomendações para filmes funcionam ao contrário: quando eu digo que o filme é bom é porque na realidade ele é uma bomba, e vice-versa. Aí a explicação para o nome do blog... A minha intenção nesse espaço é falar sobre qualquer tipo de filme: bons e ruins, novos ou antigos, blockbusters ou obscuridades. Cotações: 0 a 4 estrelas.
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Um comentário:
Na minha crítica eu também fiz essa observação de como ele lembra em termos de estrutura o documentário Cinema Novo. Porém, essa obra merece sua luz própria e que não se perca com o tempo.
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