Dentro do universo atual das adaptações para o cinema dos
quadrinhos, “Deadpool” (2016) é praticamente uma anomalia. Apesar do seu
protagonista ser um personagem da Marvel Comics de considerável popularidade, o
filme tem censura 18 anos. E essa classificação etária não é gratuita, pois a
produção realmente capricha na violência gráfica, com direito a uma gama
expressiva de cenas com mutilações explícitas diversas, além do fato do seu
teor cômico abusar do humor negro, da escatologia e da sordidez (há várias
piadas sobre masturbação e Deadpool é penetrado por um consolo pela sua
namorada). Tais elementos temáticos já eram bastante presentes nas HQs originais,
mas era de se esperar que talvez fossem atenuados nessa versão para os cinemas,
tendo em vista a obra do diretor Tim Miller ser um potencial blockbuster.
Ocorre, entretanto, que o universo de Deadpool foi recriado de forma fiel e
coerente por Miller. Mesmo uma pretensa heresia como a do anti-herói ter uma
namorada apaixonada acaba se mostrando em sintonia com o espírito distorcido
dos quadrinhos, pois a garota é prostituta e stripper. Outra característica
forte das HQs de Deadpool está presente, a metalinguagem alucinada, e suas
possibilidades criativas são muito bem trabalhadas. E há um dos ingredientes
principais para que um filme como esse funcionasse: uma boa mão de Miller para
cenas de ação, com uma conjugação de coreografias e efeitos digitais que emula
com eficiência a própria dinâmica de uma HQ de super-heróis. E também é de se
admitir que é um tremendo mérito para o cineasta conseguir extrair uma atuação
carismática do habitual canastrão Ryan Reynolds.
A combinação entre brutalidade desenfreada, comicidade
escrota e atmosfera amoral em “Deadpool” acaba criando a estranha impressão
estética de se estar vendo um típico filme B no gênero aventura fantástica com
o orçamento de uma produção classe A (percepção parecida, aliás, que se tem ao
assistir “Guardiões da Galáxia”). Até poderia ser um novo e interessante
direcionamento artístico para as próximas produções a enveredarem em adaptações
de HQs de super-heróis.
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