O cineasta norte-americano David O. Russell enveredou por
uma espécie de filão cinematográfico desde o extraordinário “O vencedor”
(2010), o do cinema populista, aquele cuja temática gira em torno de figuras
que mesmo diante de alguma dificuldade própria ou externa (condição social,
saúde, problemas familiares) conseguem transcender para um novo patamar em suas
vidas mediante o exercício de um forte poder de superação pessoal. Ainda que
tal estrutura narrativa possa parecer manjada, Russell geralmente conseguiu dar
uma cara própria dentro desse subgênero do melodrama através de alguns recursos
estéticos interessantes, como um formalismo de certa elegância, ambientação de
influência naturalista e uma ótima mão para direção de atores (Bradley Cooper
conseguiu ganhar densidade dramática em suas atuações e Robert De Niro voltou a
ter interpretações convincentes). Ainda que sem o mesmo grau de inspiração de “O
vencedor”, obras como “O lado bom da vida” (2012) e “Trapaça” (2013) mostravam
um diretor buscando uma cara própria em meio a clichês narrativos. “Joy”
(2015), entretanto, mostra que Russell sucumbiu de vez ao convencionalismo
artístico. Essa sua produção mais recente está mais para um filme institucional
a valorizar a busca pelo grande sonho americano e a biografia edificante de sua
protagonista-título (não por acaso, a própria Joy da “vida real” é uma das
produtoras da obra em questão). Mesmo o habitual cuidado formal que sempre
marcou os trabalhos de Russell se apresenta comprometido – há um excesso de
iluminação estourada a simular uma atmosfera de realismo “de neon” que não diz
a que veio. O diretor incorpora a estética televisiva de artificialismo
exagerado de programas de vendas 24 horas e toques de onirismo dentro de sua
mencionada e tradicional abordagem naturalista, mas a junção desses elementos
diversos nunca parece orgânica, tornando a narrativa truncada e sem vida. No
mais, chega até a ser curioso que “Joy” esteja em cartaz ao mesmo tempo que “A
grande aposta”, pois enquanto esse último realiza uma radiografia irônica e por
vezes impiedosa dos meandros existenciais do capitalismo, o filme de Russell
reforça aquela crença quase religiosa de que somente através do mencionado
regime econômico é permitido a qualquer cidadão enriquecer a partir somente do
seu esforço próprio e assim chegar ao seu Eldorado.
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