O diretor polonês Roman Polanski passou o diabo nessa vida.
Para começar, perdeu praticamente toda a família em campos de concentração
durante a Segunda Guerra Mundial. Depois, teve a mulher grávida assassinada por
um bando de maníacos, além de ter recebido uma condenação de estupro que quase
o levou a cumprir uma longa pena na cadeia. Quando chegou o momento de Polanski
tratar sobre o holocausto judeu na época do nazismo, surpreendeu a todos com um
filme que fugiu muito dos estereótipos desse tipo de produção – “O pianista” (2002)
é uma obra repleta de ácida amargura e um refinado senso de humor perverso, com
o cineasta optando por uma narrativa que enfatizava muito mais o absurdo da
condição humana do que privilegiando o mero realismo ou alguma lição edificante
sobre a superação pessoal. O que falta para que o filme húngaro “O filho de
Saul” (2015) tenha um alcance artístico mais efetivo e memorável é justamente
essa transcendência humanista obtida por Polanski. Até dá para entender as
opções estéticas do diretor Lászlós Nemes ao enfatizar um naturalismo brutal
baseado em vários e longos planos sequências e numa pretensamente crua
encenação repleta de violência gráfica explícita. Se nas primeiras tomadas esse
formalismo rigoroso chegas a beirar o perturbador, com o desenrolar da trama
esse impacto sensorial vai sendo cada vez mais amenizado justamente pela
excessiva repetição desse modus operandi que não permite uma variação de
sensações para o espectador, fazendo com que personagens e situações pareçam
unidimensionais demais. O próprio discurso existencial do roteiro torna confuso
e pouco convincente os dilemas morais do protagonista Saul (Géza Röhrig), em
que sua obsessão por oferecer uma cerimônia judaica tradicional de enterro para
o filho em meio a um cenário de massacres e rebeliões acaba soando mais como
uma excentricidade religiosa estéril do que como um questionamento sobre aquele
contexto histórico. Assim, por mais que haja uma certa aura de ousadia no
método de Nemes, a verdade é que “O filho de Saul” é tão convencional e
esquemático quanto a maioria do que tem sido feito no gênero nos últimos anos.
É claro que vai se apelar para a importância histórica desse tipo de obra, e
até mesmo pode rolar aquele habitual Oscar para produções estrangeiras, mas no
final das contas passado alguns meses o filme de Nemes dificilmente vai estar
colado no nosso imaginário cinematográfico.
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