O que diferencia “O outro lado da esperança” (2017) de
outras produções dirigidas pelo finlandês Aki Kaurismäki é o fato de ser a obra
do cineasta com a trama mais escancaradamente sócio-política. Vários detalhes
do roteiro apresentam forte ressonância com alguns dos principais temas que
dominam a sociedade europeia – a crescente xenofobia cultural, a cada vez mais
intensa migração de árabes para o continente em virtude de conflitos bélicos em
seus países natais, a onda de desemprego que joga a economia na informalidade e
na precariedade. Há um forte tom panfletário de crítica social na abordagem de
Kaurismäki, mas sem que isso afete o estilo habitual do diretor. Pelo contrário
– tais aspectos se complementam com bastante naturalidade e coerência. Dessa
forma, estão lá na narrativa sempre presente a comicidade baseada numa
encenação austera, a idiossincrasia ascética na caracterização de situações e
personagens, a empatia que brota de econômicos truques narrativos, os belos
números musicais que irrompem de maneira insólita, a atmosfera entre o realismo
e o poético que por vezes desconcerta o espectador. A conjunção de tais
aspectos artísticos acaba gerando alguns momentos memoráveis, principalmente na
ambígua sequência final, em que o trágico e o tom esperançoso convivem em uma
estranha harmonia.
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