quinta-feira, setembro 27, 2018

Vai trabalhar, vagabundo, de Hugo Carvana ****


Um filme como “Vai trabalhar, vagabundo!” (1973) consegue sintetizar de maneira precisa quem era a pessoa que o concebeu, bem como o contexto histórico em que foi lançado. Hugo Carvana era um ator que começou fazendo chanchadas nos anos 50 e depois participou de expressivos filmes do Cinema Novo. Assim, sua obra de estreia como diretor evidencia essa sua trajetória. O roteiro se estrutura como uma comédia picaresca e que frequentemente cai no pastelão. Ao mesmo tempo, a encenação tem um caráter libertário e por vezes antinaturalista que beira o delirante que nos remete ao modus operandi de Glauber Rocha. O que era para ser uma junção confusa de referências artísticas acaba se revelando como uma narrativa bastante funcional e divertida, carregada de um rico subtexto anárquico e humanista. A direção de Carvana é segura e consegue dar uma coerência desconcertante para uma narrativa aparentemente bagunçada – é como se o filme fosse uma grande brincadeira entre amigos, impressão essa reforçada pela sequência final, mas com um acabamento estético-temático que torna tudo muito envolvente para o espectador, além de várias nuances artísticas antológicas, vide a ótima trilha sonora, os diálogos muito espirituosos e um elenco em estado de graça (Paulo César Pereio, Nelson Xavier e o próprio Carvana apresentam algumas de suas mais memoráveis atuações). Obra fundamental na história do cinema brasileiro, “Vai trabalhar, vagabundo!” faz estranhar como o mesmo Carvana apresentou em seus últimos anos trabalhos tão insípidos e desajeitados como “Não se preocupe, nada vai dar certo” (2011) e “Casa da mãe Joana 2” (2012).

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