segunda-feira, dezembro 21, 2015

Mia madre, de Nanni Moretti ****

Os filmes do diretor italiano sempre são marcados por um traço autoral intransferível, trazendo uma espécie de sínteses das obsessões pessoais e artísticas do cineasta. Dentro dessa concepção se misturam elementos diversos como política, reminiscências pessoais, ensaios culturais, intimismo, comentário social e metalinguagem, mas sempre passando por um rigoroso filtro formal e temático que dá uma coerência existencial admirável para sua filmografia, independente do gênero no qual Moretti se aventure. Isso tudo fica bastante evidente em seu trabalho mais recente, “Mia madre” (2015), em que ele volta ao gênero do melodrama, onde ele já tinha se dado muito bem em “O quarto do filho” (2001). Na produção em questão, o diretor retoma seus temas que lhe são mais caros sem que com isso passe a impressão de acomodação. Pelo contrário – Moretti parece aprofundar seu particular estilo dentro de uma equação narrativa cada vez mais desconcertante. É como se tivesse mais de um filme dentro de “Mia madre”. Há aquele plano que mostra o cotidiano de filmagens de uma obra de caráter social por parte da cineasta Margherita (Margherita Buy), mostrando os dilemas artísticos da diretora. Por outro lado, tem uma trama intimista que envolve o tocante drama pessoal da protagonista junto ao irmão Giovanni (Moretti) que passam por todo o calvário de acompanhar os últimos dias da mãe moribunda. Além disso, a própria situação dessa matriarca carrega um forte caráter simbólico no sentido de representar a queda de um humanismo considerado ultrapassado perante uma ordem capitalista cada vez mais obtusa. E há também as sequências que mostram as confusões e constrangimentos causados por um decadente e arrogante ator norte-americano (John Turturro) no set das referidas filmagens e pelas ruas de Roma, em que as trapalhadas desse personagem parecem remeter a um humor melancólico tipicamente italiano na linha das produções de Toto e Mario Monicelli. Moretti junta todas essas narrativas paralelas e lhes dá uma unidade intrínseca extraordinária, compondo um painel humanista que navega de forma extraordinária entre a comicidade, o sentimental e a feroz crítica sócio-política e econômica, tendo por resultado final um filme que tanto pode ser considerado atemporal pela sua grandeza artística como a síntese emblemática de uma época conturbada.

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