Num primeiro momento, o documentário “Remake, Remix,
Rip-Off: About Copy Culture & Turkish Por Cinema” (2014) parece se resumir
a uma boa coletânea de infames cenas de produções turcas dos anos 60 e 70 marcadas
pela tosquice, cara-de-pau, ingenuidade e humor involuntário. Nesse sentido,
talvez o principal mérito da obra é o seu trabalho de edição: por vezes, a ágil
sucessão de hilárias sequências repletas de “defeitos visuais”, diálogos constrangedores,
encenação amadorística e generosas doses de violência e escatologia levam o
espectador a gargalhadas convulsivas. Um olhar mais atento, entretanto, pode
identificar no filme dirigido por Cem Kaya um retrato crítico e por vezes até
profundo sobre a cultura turca no período focado, época essa marcada por uma
conjuntura bem específica e difícil de reproduzir nesses tempos atuais
dominados pela internet e outros avanços tecnológicos. Naqueles tempos, a falta
de grana constante para produções nacionais, um regime jurídico diferenciado de
direitos autorais (ou, na verdade, a ausência de tal regime) e um cenário
artístico afetado pela falta de informação e pelo obscurantismo religioso levam
a uma profusão de filmes de baixo orçamento e nível formal risível de todos os
gêneros (ficção científica, aventura, fantasia, terror, comédia, melodrama). No
meio de uma temática marcada pelo grotesco e pela galhofa, Kaya tem algumas
belas sacadas narrativas, principalmente por estabelecer conexões de tal filmografia
com elementos típicos de vertentes cultuadas por cinéfilos como o exploitation
e o trash, além de mostrar a relação da decadência comercial dessas produções
com mudanças importantes na Turquia, como a consolidação de um capitalismo mais
“profissional” e o avanço do fundamentalismo religioso. Assim, mais do que um
mero exercício de nostalgia cinematográfica, “Remake, Remix, Rip-Off” acaba
sendo uma interessante obra a dissecar de forma sutil os meandros das
transformações políticas e sociais da Turquia, mas que também faz um memorável
e contundente retrato da alma fuleira e sincera de um povo.
Boa parte de amigos e conhecidos costuma dizer que as minhas recomendações para filmes funcionam ao contrário: quando eu digo que o filme é bom é porque na realidade ele é uma bomba, e vice-versa. Aí a explicação para o nome do blog... A minha intenção nesse espaço é falar sobre qualquer tipo de filme: bons e ruins, novos ou antigos, blockbusters ou obscuridades. Cotações: 0 a 4 estrelas.
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