Talvez a melhor palavra que possa definir “O décimo homem”
(2015) seja ambiguidade. O filme começa em Nova Iorque, em ambientes assépticos
e ordenados, com o protagonista Ariel (Alan Sabbagh) prestes a voltar ao seu pais
natal, a Argentina, para o que seria uma breve visita. Quando chega em um caótico
bairro popular em Buenos Aires, o mesmo local onde passou a infância e a adolescência,
o personagem parece entrar em uma espécie de misto de pesadelo kafkaniano e
viagem de volta ao passado. Cético e ateu, Ariel vai se enredando cada vez mais
na rotina e no universo de indivíduos e situações que cerca o seu pai, Usher, líder da
comunidade judaica do bairro, onde é responsável por questões diversas como alimentação,
saúde e ate mesmo a vida sentimental das pessoas. O caráter das ações das
principais figuras da trama são sempre nebulosas, não se sabendo precisar o que é legitimo interesse altruísta ou mero interesse comercial. No final das
contas, é como tudo se confundisse. E esse é um dos aspectos nos quais a ambigüidade
de “O decimo homem” se manifesta. Num sentido geral, daria para dizer que a
obra teria uma configuração de conto moral, a mostrar Ariel se obrigando a
abrir os olhos para as sua raízes judaicas e para o seu dever junto ao seu
povo. Há também, entretanto, uma estranha e sufocante atmosfera de pressão social
sobre o protagonista, em que sua individualidade e razão vão sendo reprimidos
por ortodoxias místicas e costumes tradicionais. Mesmo na conclusão do filme não
fica claro do que se tratou efetivamente a jornada de Ariel. E provável que
esse mistério seja um dos fatores que faz de “O décimo homem” uma experiência cinematográfica
perturbadora e memorável.
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