Parte significativa da filmografia do diretor
norte-americano Oliver Stone é dedicada a fazer uma espécie de inventário
sócio-político-cultural da história do seu país. Dentro desse nicho, seu maior
acerto artístico foi “JFK” (1991), que apresentava uma combinação notável entre
narrativa dinâmica e envolvente e um conteúdo aprofundado e inquietante sobre a
temática que versava. Essa síntese também é o grande mérito de “Snowden – Herói
ou traidor” (2016), obra mais recente de Stone, que foca a história do
ex-agente da CIA que denunciou os mecanismos de espionagem virtual praticada
pelos Estados Unidos. Ainda que o filme se renda a alguns convencionalismos
narrativos, a noção de ação cinematográfica é muito bem trabalhada, vide a
edição que incorpora com naturalidade e coerência efeitos digitais a simularem
o mundo da virtualidade e a encenação vigorosa e bem coreografada que extrai
uma tensão perturbadora nas sequências mais cruciais em termos dramáticos. O roteiro
apresenta um certo traço panfletário, o que fica evidente na caracterização
maniqueísta de personagens e situações, mas ao mesmo tempo sabe valorizar a
complexidade dos dilemas morais e contradições de seu protagonista, além de
mostrar detalhes das operações políticas e de segurança do governo norte-americano
que geralmente são tratadas com superficialidade na mídia “oficial”. Para falar
a verdade, é até provável que a falta de escrúpulos da CIA e do NSA a
investigarem indevidamente cidadãos nativos e governos estrangeiros seja muito
mais acentuada e cruel na realidade do que na simulação de uma obra para o
cinema. E ainda que tais fatos retratados no filme sejam ainda relativamente
recentes, a abordagem de Stone traz um traço atemporal ao deixar evidente mais
um dos métodos da permanente opressão de governos e grandes corporações sobre
os indivíduos.
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