quarta-feira, novembro 30, 2016

Creepy, de Kiyoshi Kurosawa ****

O diretor japonês Kiyoshi Kurosawa tem uma forte vinculação com o cinema de gênero, principalmente na área de interligação entre o suspense e o horror, mas sua abordagem artística é bastante diversa daquela de produções nipônicas como “O chamado” (1998) e derivados. Isso fica bastante evidente em sua obra mais recente, “Creepy” (2016). Não há grandes inovações em termos formais e temáticos, e por vezes até pode haver um certo incômodo com algumas incongruências do roteiro. O forte de Kurosawa está na construção de uma atmosfera densa e perturbadora de tensão e terror, na caracterização bizarra de personagens e situações, na forte e sutil simbologia da trama e numa encenação desconcertante que varia do intimismo dramático ao puro horror gore. Os clichês narrativos tradicionais do gênero estão presentes de maneira constante, mas uma das grandes sacadas do cineasta está na sua criatividade e virtuosismo estéticos em manipular tais recursos e os colocar em cena sob uma perspectiva insólita e mesmo de caráter desafiador. Nesse sentido, a relação emocional que se estabelece no triângulo composto pelo protagonista Takakura (Yuko Takeuchi), sua esposa Yasuko (Hidetoshi Nishijima) e o asqueroso psicopata Nishino (Teruyuki Kagawa) revela nuances existenciais inquietantes, principalmente na forma com que questiona valores morais e comportamentais. A lógica e prática distorcidas de Nishino em induzir laços emocionais estimulando o vício em drogas pesadas e exterminar famílias parece evocar uma espécie de expiação das hipocrisias da sociedade moderna. Por trás desse discurso ambíguo há um complemento formal de coerência sensorial impressionante, vide a fotografia de tons sombrios, a trilha sonora de temas efetivamente assustadores e a edição que conduz a narrativa como se fosse um macabro conto gótico.

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