Em um primeiro plano, a trama de “Spotlight – Segredos revelados”
(2015) teria como temática principal a questão da pedofilia dentro da igreja
católica. Ocorre, entretanto, que o subtexto do roteiro em questão é tão
sofisticado que aos poucos se pode perceber que o alcance da história é ainda
mais amplo. A narrativa construída pelo diretor Tom McCarthy é marcada pela
sutileza e detalhismo em vários aspectos, principalmente na elegância da
encenação e nos sinuosos e irônicos diálogos, além de um certo distanciamento
emocional que evita que o filme caia no edificante meloso ou no denuncismo
vazio. Na verdade, trata-se até de uma obra que se permite algumas ousadias
artísticas e políticas, pois o que entra em pauta de forma efetiva é uma
crítica ácida contra as estruturas de poder dentro da sociedade ocidental. Todo
o processo de jornalismo investigativo no quais os principais personagens se
dedicam é esmiuçado com profundidade e rigor, fazendo até lembrar clássicos do
gênero como “Todos os homens do presidente” (1976), mas se pode perceber que
quando tal processo toma início há obstáculos que com até certa facilidade são
transpostos. O que a história mostra como grande dilema é a dificuldade em dar
o primeiro passo, o de decidir abrir tal investigação, em que o imobilismo é
estimulado por um conjunto de instituições (igreja, polícia, justiça, imprensa)
mais dedicado a preservar o status quo do que em proteger os direitos dos
indivíduos. Nesse sentido, a figura do jornalista Walter Robinson (Michael
Keaton) é notável como síntese dos conflitos e contradições que marcam a trama –
responsável como chefe do grupo de jornalistas investigativos, aos poucos
descobre que alguns dos principais envolvidos na tramoia de ocultamento de
casos de pedofilias praticados por padres são pessoas com as quais mantém um
constante convívio social em seu cotidiano, percebendo também que por um bom
tempo, ainda que de forma inconsciente, ele mesmo foi responsável por tal
situação. São em nuances como essa que “Spotlight” se mostra uma produção acima
da média e surpreendente, evitando a solução fácil de maniqueísmos pueris ou
mesmo o viés hipócrita e conciliatório.
Um comentário:
Uma boa surpresa dessa temporada de filmes prè-Oscar.
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