Aqueles que são detratores de Steve Jobs, ou mesmo aqueles
que simplesmente não se importam com a figura em questão, podem até questionar
se ele é tão importante ou interessante assim a ponto de receber duas
cinebiografias no curto espaço de dois anos. Mas se “Jobs” (2013) era apenas
uma obra oportunista e sem inspiração a retratar a vida do célebre e polêmico
criador e CEO da Apple, esse “Steve Jobs” (2015) é bem mais interessante como
produto cinematográfico. Para começar, só o nome de Danny Boyle na direção já
faria o espectador dar uma atenção especial para a produção. E o cineasta não
se fez de rogado, construindo uma estrutura narrativa fascinante. Boyle não
optou por soluções estéticas e temáticas óbvias, e nem mesmo sua abordagem pode
ser enquadrada na simples linguagem naturalista. Talvez a referência artística
que mais venha à mente seria algumas produções delirantes de Fellini, com
destaque para “Oito e meio” (1963). A maioria da ação da trama se concentra nos
bastidores de eventos de lançamentos de produtos criados por Jobs, e dessa
forma boa parte das pessoas que fizeram parte da vida do protagonista
(familiares, amigos, parceiros de trabalho, desafetos) circula nesses ambientes
frenéticos e tensos, fazendo com que a interação entre Jobs (Michael
Fassbender) e tais personagens seja marcada por ressentimentos e discussões
acaloradas. Intercaladas com essas sequências são mostrados flashes de
noticiários e fragmentos de memórias, como se houvesse uma contraposição entre
o discurso oficial “laudatório” sobre Jobs e a realidade bem menos idealizada
que o cercava. O roteiro do filme contempla com fidelidade a complexidade dos
fatos, não caindo em maniqueísmos ou simplificações, e acaba demonstrando uma
sintonia existencial e artística com “A rede social” (2010), no sentido de também
ser uma espécie de crônica da moral e dos costumes desse milênio marcado pela
virtualidade e pelo efêmero. O formalismo barroco concebido por Boyle, repleto
de trucagens criativas e uma atmosfera que remete por vezes ao onírico, torna
essa saga sensorial sobre tecnologia, dinheiro, poder e alienação ainda mais
memorável e perturbadora.
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