quinta-feira, janeiro 07, 2016

Táxi Teerã, de Jafar Panahi ****

O diretor iraniano Jafar Panahi leva o cinema de autor para níveis insólitos e bem criativos em “Táxi Teerã” (2015). O filme em questão tem toda a sua formatação elaborada de acordo com a condição social e política do cineasta. Com severas restrições do governo do Irã para filmar, Panahi se adapta a essa situação com um modus operandi que é uma mistura de liberdade na escolha de recursos e linguagem com rigor na execução de sua concepção artística. Assim, toda a ação se desenvolve dentro de um táxi e do espaço físico externo que está ao alcance do olhar do motorista, dos passageiros e das câmeras que se encontram dentro do veículo. A ambientação escolhida para a narrativa pode parecer inicialmente bastante limitada, mas com o desenrolar de sua trama revela uma gama expressivas de possibilidades fílmicas e existenciais. Colocando-se como protagonista da história, Panahi cria um híbrido estético eficiente e de forte encanto ao combinar encenação dramática, metalinguagem e truques típicos do cinema documental. Seu senso narrativo é bastante apurado – é só reparar como as cenas registradas em pequenas câmeras portáteis e filmagens “caseiras” de celulares ganham um encadeamento fluido devido ao excelente trabalho de montagem. É como se esse esmerado trabalho formal trouxesse em seu âmago um caráter de guerrilha, no sentido de usar com precisão a sua infraestrutura limitada para provocar o maior “estrago” possível no status quo. E se esses elementos formais carregam esse conteúdo político, é claro que o discurso existencial apresenta o mesmo teor. As pequenas histórias que formam o grande mosaico narrativo são o raio x contundente e sem retoques da sociedade iraniana contemporânea. Nas conversas e depoimentos das quais o “taxista” Panahi ouve e participa podem ser percebidos alguns dos principais traços sociais e comportamentais que marcam o Irã: a opressiva mistura de patriarcalismo e religião, o preconceito contra a mulher, a censura cultural contra tudo aquilo que pode “ofender” o obscurantismo político e místico que domina o país. O roteiro revela sem cerimônias a visão pessoal de Panahi sobre essa realidade que o cerca. É de se destacar, contudo, que não se trata de puro discurso panfletário. Nessa perspectiva do cineasta, há a sutileza e a sensibilidade de sacar que o problema não está em um determinado governo ou em uma pessoa específica, mas num conjunto de valores que está arraigado fortemente em grande parcela da população. Dentro dessa ordem, o subtexto de “Táxi Teerã” mostra que a grande subversão está no humanismo, fator esse que está presente em cada fotograma desse trabalho extraordinário de Panahi.

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