terça-feira, fevereiro 07, 2017

A qualquer custo, de David Mackenzie ****

Com uma certe frequência tem aparecido nos últimos anos produções que se apresentam como faroestes contemporâneos, em que a estrutura narrativa se formata como uma releitura das principais características formais e temáticas do gênero, mas com tramas situadas em um plano temporal mais contemporâneo. Se algumas dessas obras utilizam essa abordagem por questões mais estéticas, vide o sensacional “Rejeitados pelo diabo” (2005), em “A qualquer custo” (2016) a aproximação com o western vem também por inquietantes razões sócio-políticas e existenciais. Nesse sentido, é de se reparar na forma em que os cenários interioranos do Texas são mostrados na tela – os grandes planos da direção de fotografia remetem a clássicos trabalhos de John Ford e Howard Hawks pela grandiosidade e beleza melancólica, mas também situam a conturbada situação econômica de grande parte da população norte-americana, mostrando fazendas em situação precárias e pequenas cidades de comércio arruinado e bancos prosperando. De certa forma, alguns faroestes crepusculares já apresentavam esse quadro em que por trás dos conflitos entre “mocinhos e bandidos” havia os interesses de instituições financeiras, corporações empresariais e grandes latifundiários em jogo. Um dos aspectos mais perturbadores do filme dirigido por David Mackenzie é justamente retratar com amarga ironia como certas coisas permanecem as mesmas na sociedade ocidental. A sutileza de tal subtexto de “A qualquer custo” vem acompanhada por uma reconstrução primorosa dos preceitos narrativos do faroeste. O delineamento de situações e personagens é feito de maneira serena e com profundidade psicológica, sem maniqueísmos e demais moralismos fáceis, fazendo com que a tensão fique cada vez mais palpável. No terço final, quando a ação fica mais intensa e gráfica, as explosões de violência têm considerável impacto dramático e se mostram coerentes com os dilemas cruciais da trama. As antológicas atuações de Jeff Bridges e Bem Foster e o os climáticos temas compostos por Nick Cave e Warren Ellis para a trilha sonora, aliados a ótimas canções country, pontuam com sensibilidade a narrativa de talhe clássico concebida por Mackenzie.

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