Na conclusão da trama de “Fragmentado” (2017), fica
estabelecida uma conexão com “Corpo fechado” (2000) no sentido de que haja uma
inter-relação entre as obras pelo fato de pertencerem a um mesmo universo
existencial, havendo até uma sugestão de que haverá uma continuação ou assemelhado
promovendo o encontro entre personagens de ambas as produções. Mas a
aproximação que se pode fazer entre esses dois filmes não se dá apenas por essa
questão. Nos dois trabalhos se pode observar semelhanças em termos de concepção
artística, tanto pelo lado estético como o temático – é como se o diretor M.
Night Shyamalan promovesse uma espécie de releitura particular do gênero “aventura
de super-heróis” no cinema, com a diferença de que em “Corpo fechado” ele
mostrou a gênese de um campeão do “bem”, enquanto que em “Fragmentado” está em
foco a origem de um supervilão. Se no filme mais antigo havia algumas ideias
interessantes que foram mal trabalhadas e acabaram resultando em uma obra um
tanto vacilante e truncada em termos de narrativa e que se levava demasiadamente
a sério, em “Fragmentado” abordagem e execução demonstram uma evolução
impressionante. Shyamalan não temeu cair no exagero e mesmo no ridículo, dando
ao seu filme uma atmosfera tensa, sórdida e beirando o delirante. Filmes de
super-herói exigem uma dimensão épica e icônica em sua concepção, e o cineasta
parece ter entendido tal necessidade. Ao invés de se prender em caracterizações
psicológicas pretensiosas ou nos excessos melodramáticos de histórias paralelas
como havia ocorrido em “Corpo fechado”, “Fragmentado” investe numa dinâmica
narrativa mais objetiva, com direito a sequências de ação de notável
desenvoltura cênica e a uma atuação alucinada de James McAvoy (é impressionante
como olhares e gestos se alternam com naturalidade a cada personalidade que se
muda do protagonista Kevin). E mesmo as sequências de flashback com Casey (Anya
Taylor-Joy) se incorporam à trama de forma surpreendente, sem a necessidade de “amarrar
pontas” e reforçando o caráter ambíguo e misterioso de “Fragmentado”. Assim, no
seu conjunto geral, “Fragmentado” até faz imaginar como seria se Shyamalan
fosse dirigir algum filme da Marvel ou da DC.
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