Em um primeiro momento, a primeira coisa que salta aos olhos
ao assistir a “O formidável” (2017) são algumas brincadeiras e referências
estéticas concebidas pelo diretor Michel Hazanavicius que perpassam a narrativa
que evocam sequências memoráveis de produções marcantes dirigidas por Jean-Luc
Godard, o protagonista da trama do filme baseada em fatos reais. Por vezes tais
truques são pertinentes e engraçados, em outros momentos são apenas pueris.
Também é de se destacar que a produção se estrutura quase como se fosse uma
comédia romântica, com um roteiro que enfatiza situações e soluções típicas do
gênero. Tais detalhes temáticos e narrativos, entretanto, representam uma superfície
enganadora sobre as reais intenções da obra, pois a efetiva força de “O
formidável” está no contundente subtexto do seu roteiro e no vigor de sua
encenação, fatores esses ainda reforçados pele interpretação sanguínea de Louis
Garrel no papel de Godard. Em meio aos desacertos, contradições e dilemas do
personagem principal com as causas e consequências do maio de 1968 em Paris está
uma arguta observação sobre o papel de um artista perante a sociedade em que
está inserido. No meio de cobranças para se mostrar acessível para os seus
admiradores, em cumprir expectativas advindas da condição de ser um gênio
cinematográfico “consagrado” e também em se enquadrar nos padrões de
comportamento “civilizado” de uma sociedade pequeno-burguesa, o que fica
realmente estabelecido como o grande mote da trama é a necessidade de
reinvenção e apreensão da realidade por parte do artista diante de um evento
histórico tão complexo e perturbador quanto as revoltas estudantis da época.
Nesse aspecto, o filme de Hazanavicius não facilita as coisas – Godard quase
sempre é visto pelo olhar da jovem e algo ingênua esposa Anne Wiazemsky (Stacy
Martin), sugerindo-se uma personalidade irascível, geniosa e arrogante por
parte do cineasta, mas que sutilmente esconde um sentimento de inconformismo e
da busca de preservar o seu senso humanista perante hipócritas cobranças e
acusações daqueles que o cercam. A melancólica conclusão de “O formidável”
sublinha com notável coerência e precisão as verdadeiras ambições artísticas e
existenciais do longa-metragem de Hazanavicius.
Um comentário:
O Formidável é um filme com potencial, mas do qual lhe faltou asas para obter o seu grande voo final. https://cinemacemanosluz.blogspot.com.br/2017/10/cine-dica-em-cartaz-o-formidavel.html
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