segunda-feira, outubro 30, 2017

O formidável, de Michel Hazanavicius ***

Em um primeiro momento, a primeira coisa que salta aos olhos ao assistir a “O formidável” (2017) são algumas brincadeiras e referências estéticas concebidas pelo diretor Michel Hazanavicius que perpassam a narrativa que evocam sequências memoráveis de produções marcantes dirigidas por Jean-Luc Godard, o protagonista da trama do filme baseada em fatos reais. Por vezes tais truques são pertinentes e engraçados, em outros momentos são apenas pueris. Também é de se destacar que a produção se estrutura quase como se fosse uma comédia romântica, com um roteiro que enfatiza situações e soluções típicas do gênero. Tais detalhes temáticos e narrativos, entretanto, representam uma superfície enganadora sobre as reais intenções da obra, pois a efetiva força de “O formidável” está no contundente subtexto do seu roteiro e no vigor de sua encenação, fatores esses ainda reforçados pele interpretação sanguínea de Louis Garrel no papel de Godard. Em meio aos desacertos, contradições e dilemas do personagem principal com as causas e consequências do maio de 1968 em Paris está uma arguta observação sobre o papel de um artista perante a sociedade em que está inserido. No meio de cobranças para se mostrar acessível para os seus admiradores, em cumprir expectativas advindas da condição de ser um gênio cinematográfico “consagrado” e também em se enquadrar nos padrões de comportamento “civilizado” de uma sociedade pequeno-burguesa, o que fica realmente estabelecido como o grande mote da trama é a necessidade de reinvenção e apreensão da realidade por parte do artista diante de um evento histórico tão complexo e perturbador quanto as revoltas estudantis da época. Nesse aspecto, o filme de Hazanavicius não facilita as coisas – Godard quase sempre é visto pelo olhar da jovem e algo ingênua esposa Anne Wiazemsky (Stacy Martin), sugerindo-se uma personalidade irascível, geniosa e arrogante por parte do cineasta, mas que sutilmente esconde um sentimento de inconformismo e da busca de preservar o seu senso humanista perante hipócritas cobranças e acusações daqueles que o cercam. A melancólica conclusão de “O formidável” sublinha com notável coerência e precisão as verdadeiras ambições artísticas e existenciais do longa-metragem de Hazanavicius.

Um comentário:

Marcelo Castro Moraes disse...

O Formidável é um filme com potencial, mas do qual lhe faltou asas para obter o seu grande voo final. https://cinemacemanosluz.blogspot.com.br/2017/10/cine-dica-em-cartaz-o-formidavel.html