Há muitos anos que o diretor francês Robert Guédiguian filma
praticamente da mesma forma. Sua narrativa é de estrutura clássica, a encenação
é um misto de fluidez e rigor, a temática sempre sintetiza intimismo com olhar
crítico sobre as mazelas sociais e políticas. Ele até pode ser previsível em
seus preceitos artísticos-existenciais, mas sempre os coloca em prática de forma
vigorosa. Em algumas oportunidades o resultado final não chega a ser tão
memorável, mas quando ele acerta a mão de verdade, a impressão que resta é de
um forte impacto emocional para o espectador. “Uma casa à beira-mar” (2017) é
um desses pontos altos da carreira do cineasta. O roteiro traz uma série de
elementos bastantes caros para a sociedade na atualidade: descontentamento com
a globalização econômica massacrante, a perseguição a refugiados e imigrantes,
a nostalgia por um passado mais humano. A visão expressa pelo filme sobre tais
temas tem um forte caráter panfletário, por vezes beirando a ingenuidade e o
anacronismo, só que Guédiguian formata tudo isso com uma convicção e uma
lucidez contundentes em sua narrativa que acaba encantando pelo humanismo sem
concessões de tal abordagem. As simbologias imagéticas e textuais são simples,
diretas, mas altamente eficazes na delicadeza e precisão de sua execução. Mesmo
a forma com que o cenário natural em que a história se passa, a de uma bela vila
de pescadores no interior da França, foge da simples caracterização “cartão
postal” e se configura como um pequeno e complexo universo a refletir as
contradições e dilemas da Europa contemporânea. No mais, “Uma casa à beira mar”
também representa uma impressionante depuração das melhores qualidades de
Guédiguian como realizador – a direção de atores extrai nuances dramáticas magníficas
das atuações do elenco, a atmosfera do filme varia de maneira natural entre a
dureza realista e uma doçura quase fabular, o discurso humanista alia
melancolia e esperança nas doses exatas. A sensacional sequência final da
produção, de um lirismo pungente à flor-da-pele, coroa com perfeição as
coerentes soluções autorais de Guédiguian para a sua obra.
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