sexta-feira, novembro 16, 2018

O grande circo místico, de Cacá Diegues *


O grande mérito artístico de “Bye Bye Brasil” (1979), obra que talvez seja a realização mais iluminada de Cacá Diegues como diretor, era fazer um lúcido retrato entre o amargo e o irônico das mazelas econômicas, sociais e morais de um Brasil profundo através de uma marcante síntese de narrativa de forte dinamismo cênico, elenco de interpretações carismáticas e um roteiro repleto de notáveis nuances dramáticas e cômicas ao contar as peripécias de uma trupe de artistas mambembes pelo interior nacional. A trama de “O grande circo místico” (2018), filme mais recente de Diegues, tem uma temática semelhante ao narrar a história de uma família de profissionais do circo do título do filme ao longo de 100 anos. O parentesco entre as duas produções, entretanto, parece parar por aí, pois há uma distância abissal em termos de qualidade artística entre ambas. O que uma tinha de vivacidade criativa e precisão formal nas suas ideias a outra despeja na tela concepção e execução mofadas e por vezes até indigente. Pode-se até dizer que havia uma pretensão ousada por parte de Diegues em evocar um certo caráter onírico e grotesco para a obra, mas a forma como isso é colocado em cena é desastroso. O que era para ser poético e refinado em termos estético e existencial acaba enveredando para o brega e a vazia opulência visual. Mesmo a belíssima trilha sonora original composta por Chico Buarque e Edu Lobo é desperdiçada de maneira lamentável – na realidade, por vezes a impressão é de que o filme parece um longo vídeo clip mal-ajambrado para adequar com uma coerência textual meio qualquer nota os números musicais com um roteiro digno de minissérie global derivativa. Há passagens que até insinuam que “O grande circo místico” tinha potencial para ser algo bem melhor, principalmente na expressiva sequência de sexo acrobático entre Beatriz (Bruna Linzmeyer) e Fred (Rafael Lozano) e nas cenas finais das gêmeas que flutuam em meio as ruínas do circo, mas esses breves acertos sucumbem diante da direção artrítica de Diegues.

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